Crochê fashion: a nova cara do handmade
Paula Corrêa, diretora criativa da Pou, fala sobre identidade e novas possibilidades das técnicas manuais com peças e acessórios cheios de personalidade
Há algum tempo, o crochê e o tricô marcam presença em várias peças e se reinventa a cada temporada. Em estilos diferentes e com novas técnicas, a roupa feita à mão conquistou seu lugar cativo no guarda-roupa em que até os acessórios se renderam à tendência.
Pensando nisso, conversamos com a diretora criativa da marca Pou para entender como o fenômeno aparece em peças de valor único. Paula Corrêa fundou a etiqueta em 2021 e se diferencia por sua autenticidade e por romper com os padrões convencionais. Em peças ousadas, a marca faz uma nova leitura do handmade com criatividade e atitude para os dias de hoje. Confira a entrevista!
Uma das grandes tendências nas passarelas e nas ruas é a roupa feita a partir de técnicas manuais. Para você, a que se deve esse fenômeno na moda hoje?
Esse fenômeno das técnicas manuais tem se dado justamente pela exclusividade que carregam, e pela necessidade de valorizarmos o trabalho de pequenos artesãos que é algo presente na nossa cultura. Porém, por muitas décadas, foram substituídos por máquinas para atender a uma necessidade de crescimento em escala da indústria têxtil. Na contramão disso, é perceptível que as técnicas manuais geram uma conexão pessoal muito maior com o cliente, que passa a enxergar o produto com outro olhar, seja pelo toque ou pelas texturas. É como sentir o carinho do artesão que se dedica para fazer a modelagem impecável. Isso agrega valor ao produto, pois cada peça é única e atrai o olhar de clientes que buscam cada vez mais originalidade e exclusividade. Sou apaixonada pelo trabalho manual e, apesar de já ter feito peças com diversos tecidos e técnicas, sem dúvidas, aquelas feitas de crochê são as minhas preferidas da coleção. Além disso, lançamos uma bolsa feita à mão com cordas náuticas recentemente. É tão lindo ver o processo e, principalmente, a individualidade de cada peça.
Boa parte das suas peças traz esse aspecto manual na confecção. Como você traduz o handmade na sua concepção criativa?
Acredito que o handmade imprime valor à peça e a torna única. Para mim, é muito diferente daquela confeccionada por uma máquina. É arte e transmite personalidade e autenticidade. Uma peça feita à mão sempre terá uma diferença, mesmo que imperceptível. Ela é exclusiva, produzimos em pequenas quantidades e, muitas vezes, sob demanda. A produção é morosa e exige muito cuidado. Além disso, uma peça handmade é praticamente impossível de ajustar. Por exemplo, o crochê. Caso não fique perfeito no corpo da cliente, precisamos refazer a peça inteira, pois ela é produzida fio a fio. Se um único fio desmanchar, todos os outros também se perdem. Por isso, o desenvolvimento deve ser muito bem pensado e estudado para ter o caimento perfeito no corpo.
Ao longo de sua trajetória, quais são as suas principais inspirações para conceber uma coleção? As técnicas manuais sempre estiveram no seu radar?
Sempre fui apaixonada pela alta-costura e nunca tive dúvidas de que sempre quis seguir esse caminho. Amo marcas como Balmain, Julie Macdonald, Saint Laurent, Nicolas Jebran, Hassidriss, pois possuem identidades parecidas com a minha marca em alguns desfiles e coleções. Por amar esse universo, sempre fui muito curiosa e brinco que “respiro moda”, pois, em grande parte do meu dia, eu me dedico a pesquisas de referências. É através desse estudo de percepções - desde streetstyle, passando por desfiles, tendências e meus gostos pessoais - que desenvolvo as minhas coleções. Sou extremamente observadora, e já me baseei em obras de arte para desenvolver modelagens de vários produtos. Quanto à técnica manual, por eu ter um carinho ímpar e enxergar o valor em cada peça, sempre procuro manter na coleção. Mas, por observar as necessidades das minhas clientes em outras linhas mais casuais, optei por explorar também outras matérias-primas como o couro e a seda, além de novas cores que, em breve, estarão na nova coleção.
O que devemos observar em uma peça de tricô ou crochê para valorizar a silhueta feminina?
Nossas peças de crochê são muito bem pensadas para marcarem o corpo, deixando as curvas femininas bem acentuadas. Todos os vestidos possuem modelagens mais justas. Por isso, o desenvolvimento é muito bem pensado, desde a composição do fio e de qual tipo devemos utilizar. Para mim, fios mais grossos, por exemplo, não transmitem delicadeza e “sensualidade”, que são o DNA da marca. Optamos por pontos mais justos e estruturados para não adicionar volumes nas peças. Um detalhe muito importante é que o crochê, por si só, possui transparência, ou seja, dá um toque mais sensual à peça. Portanto, a somatória desses detalhes é muito bem pensada para atingirmos a modelagem e o caimento perfeitos.
Os acessórios também incorporaram técnicas que imprimem exclusividade às peças, como o trançado e outros detalhes. Como eles podem arrematar um look?
Com certeza, os detalhes são a parte mais importante e o que diferem uma marca de outra, e o acessório carrega muito o nosso estilo pessoal e interesse visual. Para o Paris Fashion Week, fizemos um vestido - modelo Biarritz - que é inteiro em crochê com fios que formam uma trança desde o decote do colo até a calda. Utilizamos, em uma única peça, 13 cones de fiação e 11.700 metros de fios de crochê. O vestido pesa 4 quilos. Para mim, não é apenas um vestido. É uma obra de arte. Isso faz o cliente perceber o valor, pois cada detalhe é pensado com muito cuidado para que fique impecável. Outro detalhe, que se tornou uma característica única, foi usar as medalhas com tásseis [pingentes de franjas] que trazem aquele toque mais “descolado” e diferente. São esses detalhes que tornam a identidade da minha marca única.