Viagem

Islândia - Um roteiro além da Aurora Boreal

Terra do fogo e do gelo, a Islândia domina da mesma maneira a fantasia, a ciência e o espaço, por onde suas luzes dançam e produzem maravilhas singulares

nature outdoors river water waterfall
Foto: Divulgação/Visit South Iceland

É em uma região selvagem, rica em lendas, como a existência de elfos, seres místicos que moram em fendas de rochas, de vulcões ativos, campos de lava e de paisagens dramáticas que nossa experiência aconteceu.

Na capital, Reykjavík, ideal para ser descoberta a pé, está a agitação cultural, uma vida noturna fervilhante e muitos restaurantes que servem ingredientes típicos e sofisticados, com frutos do mar e carne de caça. Se quiser algo mais prático, pode se jogar no delicioso (e famoso) cachorro quente Baejarins Betzu. Ele é servido em um trailer, no centro da cidade, e preparado com salsicha de cordeiro, cebolas crocantes caramelizadas e um molho secreto maravilhoso. Tudo sempre regado à boa cerveja e à bebida típica da Islândia, o brennivín, uma aguardente de polpa de batata fermentada e cominho.

Minha dica é não zarpar da cidade antes de comprar o famoso suéter lopapeysa. Produzido com o pelo das ovelhas da região, cujas lãs são consideradas das mais quentes do mundo, os fios possuem fibras internas macias e isolantes, resistentes à água. Em tons terrosos e neutros, formam uma combinação perfeita para barrar os ventos frios e misturar-se na paleta do destino.

Foto: Pimpa Brauen

Ainda em Reykjavík, entre todos os passeios, vale destacar uma das esculturas de aço mais famosas da cidade, em formato de barco viking, chamada de Viajante do Sol. Também tem a maravilhosa arquitetura do Harpa House, uma sala de concertos e de conferências com fachada de vidro, inspirada na paisagem de basalto que cobre o país. Depois é só se jogar nas pequenas ruas coloridas que abrigam pequenas casas charmosas, inúmeras lojas de suvenires e animados barzinhos.

No trajeto que seguimos em busca da tão sonhada aurora boreal, participamos da expedição conduzida com maestria por Marco Brotto. O fenômeno, como ele esclarece, “acontece quando o plasma resultante das atividades solares entra em contato com elementos da atmosfera terrestre”. O hotel escolhido para a primeira noite em solo islandês não poderia ter uma vista mais privilegiada – da belíssima igreja Hallgrimskirkja.

A procura pelas luzes dançantes teve início já no primeiro dia. Um dos detalhes interessantes dessa viagem é que há um caminho predeterminado para percorrer, mas, à medida que as condições climáticas são avaliadas, tudo pode mudar. Num piscar de olhos, em um distrito diferente, uma ponte pode cair, o vento pode se tornar forte demais para transitar de carro ou até mesmo um vulcão entrar em erupção.

Foto: Pimpa Brauen

"A MARAVILHOSA arquitetura DO Harpa House, UMA SALA DE CONCERTOS E DE CONFERÊNCIAS CUJA FACHADA É TODA DE VIDRO, INSPIRADA NA paisagem de basalto QUE COBRE O PAÍS."

Foto: Pimpa Brauen

Muitas vezes dirigimos por horas para avistar o espetáculo e, quando chegamos ao local, a neve ou a chuva simplesmente começava a cair, ofuscando o horizonte a nossa frente. Era uma questão de sentir o frio na barriga e entregar-se ao imprevisível.

No primeiro dia da caçada, nevou e ela não apareceu. No segundo dia, ela apareceu tímida, como se estivesse se apresentando. Nos dias seguintes, bailou e brilhou, nos envolvendo em um manto verde e mágico, tornando todos os momentos únicos. Era impossível conter as lágrimas.

Com quase 90 expedições na bagagem, Brotto se define como um caçador de destinos. Ele é um apaixonado pelo que faz e, durante todo o tour, analisa dados da Nasa, a agência espacial americana, e estuda outras informações meteorológicas, a exemplo da cobertura das nuvens, da velocidade do vento, da pressão atmosférica e do campo magnético, para depois apontar onde estarão as damas da noite. Junto com ele, em todas as expedições, um guia de sua equipe está sempre presente. Os dois, em sintonia perfeita, nos levam aonde a mágica acontece. É tudo preciso e científico.

Com o olhar voltado para passeios diferentes e de contemplação desde jovem, Brotto lembra que a primeira vez que pensou na aurora boreal foi no Death Valley National Park, nos Estados Unidos. Depois de algumas oportunidades para conhecê-la, incluindo um cruzeiro para o Alasca, foi até Tromsø, na Noruega, onde finalmente avistou uns dos movimentos mais intrigantes do espaço. “Eu não tive noção da força daquele instante, ali, quando aconteceu, e de como ele modificaria meus planos.” Quis então estudar tudo sobre o assunto, conversar com profissionais do setor e dedicar-se às rotas de turismo do Círculo Polar Ártico. Para quem deseja aventurar-se por essas terras, o curitibano costuma dizer que é preciso seguir as normas locais de segurança, prestar atenção às condições do clima e ser persistente. “Vale a pena, a Islândia é apaixonante”, enfatiza.

Foto: Pimpa Brauen

"QUILÔMETROS E mais quilômetros SE PASSARAM DURANTE TODO O trajeto, EM UMA paisagem DELICADA, ENTRE ROLOS DE FENO E OVELHAS DE PELAGEM LONGA. OS cavalos também eram hipnotizantes, COM SUAS CRINAS GROSSAS E CAUDAS COMPRIDAS, AGITADAS PELO VENTO."

Algumas vezes dirigimos horas até encontrar os feixes multicoloridos. Em outras ocasiões, íamos dormir, depois de um dia repleto de aventuras e, durante a madrugada, éramos surpreendidos por batidas na porta. Era Brotto, sempre alerta, que acordava um a um para dividir a surpresa. Vestia-me rapidamente e, ao abrir a porta da suíte, deparava-me com a valsa das luzes me convidando a dançar.

Seguimos em nossa travessia pela Islândia boquiabertos com tanta beleza selvagem. Durante os dias, passamos por cenários onde foram filmados clássicos como os de James Bond (A View to a Kill e Die Another Day), Vikings e Game of Thrones. Quilômetros e mais quilômetros se passaram durante todo o trajeto, em uma paisagem delicada, entre rolos de feno e ovelhas de pelagem longa. Os cavalos também eram hipnotizantes, com suas crinas grossas e caudas compridas, agitadas pelo vento. Nas paradas, os cardápios oferecem lanches leves ou pratos preparados com carne de baleia, além da iguaria feita com carne de tubarão podre, o hákarl, bacalhau ou até carne de cavalo e cabeça de ovelha

land nature outdoors shoreline water sea coast mountain range promontory scenery
nature ice outdoors mountain snow glacier
promontory sea nature water outdoors shoreline cliff rock coast land
scenery nature outdoors landscape aerial view
Foto: Pimpa Brauen

"AO LONGO DA COSTA, FOI POSSÍVEL CHEGAR A Jökulsárlón – Glacier Lagoon, PARTE DO PARQUE NACIONAL Vatnajökull, CUJAS ÁGUAS, DE UM azul marcante, PARECIAM VERMELHAS AO ENTARDECER."

Indicado como rota turística obrigatória, o “Círculo Dourado” fica a 250 quilômetros de Reykjavík e desperta a atenção dos turistas pelas cachoeiras e por sua beleza cênica. Entre uma aurora e outra, foi bacana desvendar Gullfoss Waterfall, que recebe 100 mil litros de água glacial por segundo, deslizando do Rio Hvitá por camadas irregulares até despencar os 31 metros de sua garganta e produzir um jato de água fria capaz de molhar quem se aproxima hora de usar as capas de chuva. Seja para observar de longe, seja para entrar atrás de uma delas, como em Skógafoss ou em Seljalandsfoss, o circuito pede por uma visita ao gêiser Strokkur, que, a cada oito ou dez minutos, jorra água fervente a 30 metros de altura, e no Parque Nacional Þingvellir, onde está o maior lago natural da região.

Ao longo da costa foi possível chegar à Jökulsárlón - Glacier Lagoon, parte do Parque Nacional Vatnajökull, cujas águas de um azul marcante pareciam vermelhas ao entardecer. O pano de fundo daquela vista eram os blocos de pequenos icebergs e os fragmentos de gelo que se desprendiam da geleira e flutuavam até desembocar no Oceano Atlântico. À procura dos cardumes de peixes que se concentram ali, focas e pássaros povoam toda a superfície. Adiante, os pedaços das geleiras que resistem inteiros por mais tempo são levados até a orla, compondo a famosa Praia de Diamantes. O nome se dá pelo contraste das pedras de gelo transparentes sobre a areia vulcânica preta da praia.

Por fim, antes de voltar para casa, o spa termal Sky Lagoon disponibilizou seus serviços e pudemos mergulhar em uma lagoa geotérmica artificial, com borda infinita voltada para o Porto de Kàrsnes. Inaugurado em março deste ano, o espaço propõe “nutrir os sentidos” e tem piscina com água de geleira, banho de vapor, caminhada pela névoa fria e esfoliação com sal marinho. Imbuídos da essência islandesa, voltamos certos de que o fundamental é sair da zona de conforto e aproximar-se das surpresas que a natureza oferece. De coração aberto e de martelo na mão.

nature river water outdoors waterfall
clothing river water nature outdoors coat jacket hood waterfall person
Foto: Pimpa Brauen

Tags

Posts recomendados