Cultura

Metaverso: o que é e como ele pode influenciar em nossa vida?

Mark Zuckerberg quer se tornar seu imperador. As marcas já se rasgam por ele. E o mercado de arte prospera nesse novo terreno. O que é o metaverso, e como ele poderia transformar nossas vidas?

plant purple iris flower blossom person human
Um mundo criado em realidade virtual pelo FASHION INSTITUTE OF DIGITAL FASHION para as marcas Richard Quinn e Royal Salute

O futuro nunca pareceu tão próximo. Apesar daqueles que ainda consideram os mundos virtuais como ficção científica, poderemos em breve deixar a terra firme para trás e explorar os limites digitais do metaverso, esses mundos no interior do mundo, potencialmente ilimitados e acessíveis pelos fones de ouvido de realidade virtual. Uma rede de territórios alojados na internet, onde o videogame Second Life foi um dos pioneiros, no qual cada um evolui sob a forma de um avatar e já se pode fazer mercado, comprar roupas ou assistir a concertos. No ano passado, o de Travis Scott, na plataforma do jogo Fortnite, reuniu 12 milhões de espectadores virtuais, conectados nos quatro cantos do globo.

Digital em leilão

O mercado de arte já está dentro. A medida que se multiplicavam as obras digitais, que existem somente nas telas e são comercializadas na forma de NFT (certificados numéricos de autenticidade e propriedade), a casa de leilões Sotheby's compreendeu rapidamente seu potencial lucrativo. Ela lançou no mês de outubro sua plataforma Sotheby's Metaverse, onde organiza vendas por leilão de obras virtuais. No momento, as mais lucrativas chamam-se Cryptopunks, miniaturas pixelizadas de rostos ficticios, cujos preços chegam ate 500 mil dolares. "É uma nova maneira de apreciar a arte, com um mercado inteiramente novo, onde não se conhoce ainda 90% dos colecionadores", afirma Michael Bouhanna, que codirige o ramo digital da Sothoby's. É inclusive por meio do Twitter que ele entra em contato com os jovens artistas e colecionadores, que expõem no metaverso como fariam em uma galeria de arte. "Antes das NFTs, consumia-se a arte digital em instalações imersivas que raramente ultrapassavam a barreira do mercado", prossegue ele. "Hoje, os artistas podem vender suas obras de maneira bem mais eficaz.". A casa de leilão chegou até mesmo a reproduzir sua mítica sede londrina no metaverso Decentraland, onde pode-se visitar suas galerias, suas exposições de NFT e acompanhar as vendas ao vivo. Coisas que viram a cabeça dos compradores tradicionais, que agora dividem o terreno com jovens gamers, cujo poder de compra se conta em criptomoedas. 

Descrito pela primeira vez em 1992 pelo escritor americano Neil Stephenson em seu romance distópico O Samurai Virtual, o conceito de metaverso tomou amplitude desde que Mark Zuckerberg, ansioso por restaurar a imagem do Facebook, do Instagram e do Whatsapp, rebatizou sua empresa matriz de Meta e anunciou um investimento de 10 bilhões de dólares no desenvolvimento de seu próprio universo virtual. A sociedade Unity Software, por sua vez, comprou o Weta Digital, o estúdio de efeitos especiais do diretor Peter Jackson, cujas tecnologias utilizadas em Avatar e em O Senhor dos Anéis deverão ajudá-la a desenvolver seu próprio metaverso.

Homer Simpson veste Balenciaga

De Hollywood ao Vale do Silício

Porque o cinema fantasia, o Vale do Silício executa. A volta de Matrix e de seu ciberespaço, criado por máquinas para escravizar os humanos, nunca pareceu tão atual. Em Jogador Numero 1, adaptado do romance de Ernest Cline, Steven Spielberg dá vida ao OASIS, um videogame de realidade virtual no qual as personagens embarcam em uma gigantesca caça ao tesouro. Uma vez que o mundo real está em ruínas, as personagens lutam para reinar no metaverso. "O que é fascinante nesses filmes é que eles mostram a capacidade que os seres humanos têm de imaginar as próximas etapas do desenvolvimento e da tecnologia antes mesmo que tenhamos as ferramentas para utilizá-las", destaca Miriam Ross, doutora e conferencista em cinema e realidade virtual na Victoria University de Wellington. "Eles encarnam tanto os nossos sonhos quanto nossos medos de que as tecnologias de um futuro próximo podem transformar nossas vidas. E têm muito a dizer sobre nosso estado de espírito atual". Para ela, a realidade virtual oferece também a possibilidade de mergulhar um pouco mais profundamente no universo fictício do cinema, onde o espectador poderia, eventualmente, interagir com os elementos e personagens de um filme, ou até mesmo ter um impacto sobre sua história. Esperando por isso, diretores aprendizes apaixonados por games já estão produzindo filmes dentro do próprio metaverso, tais como o britânico Joe Hunter, com seus curta-metragens que apresentam os avatares na plataforma VR Chat. É disso que se trata o mundo digital: fugir do mundo real para realidades mais convidativas, onde cada um pode se transformar na melhor versão de si mesmo.

person human
Homer, Demna Gvasalia e Marge Simpson de Balenciaga
person human meal food
person human sunglasses accessories accessory people
Anna Wintour na fila A de um desfile da Balenciaga

Democratizar a criação

E tornar-se alguém na era de ouro das redes sociais é, antes de mais nada, projetar uma imagem convincente. No vídeo de apresentação da Meta, vemos o avatar de Mark Zuckerberg escolhendo roupas virtuais, de um jeans e camiseta a uma roupa de astronauta. Não se preocupe, não seremos obrigados a nos vestirmos como um tech-bro no metaverso, a moda já deu alguns passos à frente. No futuro, cada marca poderá ter sua linha digital - é o que afirmam Natalia Modenova e Daria Shapovalova. Elas inauguraram a plataforma de venda de roupas digitais DRESSX, que oferece tanto peças clássicas quanto trajes de ficção científica de alta-costura, que podem ser comprados sob a forma de NFT. Daria lembra que, em alguns países como o Reino Unido, cerca de uma em cada dez pessoas só compra uma roupa para postá-la nas redes sociais, antes de devolvê-la (pesquisa Barclaycard). "Essas peças não têm necessidade de serem produzidas, elas podem existir somente no espaço digital. Ao mesmo tempo, ambas vêem isso como o futuro da criação de conteúdo, uma forma de reduzir a pegada do carbono na moda, diminuindo sua produção física e tornando-a mais acessível. A plataforma recentemente permitia, por exemplo, que seus membros experimentassem virtualmente um vestido de alta-costura com a assinatura Balenciaga, o que somente alguns poucos clientes poderiam adquirir no mundo real.

clothing apparel fashion robe cape gown
Capa virtual da L'Officiel Ucrânia, pela dupla de fotógrafos Synchrodogs

Desde então, a marca tem multiplicado suas metarreflexões sobre a acessibilidade da moda: na sua última apresentação, a chegada dos convidados no tapete vermelho no Théâtre du Châtelet, transmitida ao vivo dentro da sala, foi de fato o desfile em si, onde as criações de Demna Gvasalia, diretora artística da marca, ficaram ombro a ombro com os trajes das celebridades. Mais tarde, foi projetado um episódio dos Simpsons especialmente concebido, no qual Homer, Marge e os outros voam para Paris e pisam na passarela da marca. Um show dentro de um show, uma alegoria poderosa ilustrando a maneira como os mundos fictícios podem democratizar a moda. "A semântica da moda mudou, a indústria deve segui-la!", afirma Leanne Elliott Young, cofundadora do Institute of Digital Fashion de Londres, inaugurado em 2020. Lá ensina-se tudo o que pode fazer o futuro da moda digital, desde a criação em 3D até as vendas em realidade aumentada. Seu manifesto chama à transformação de um "sistema que não funciona mais" para uma indústria inclusiva, em que cada um terá suas oportunidades de triunfar e de exprimir seus pontos de vista. "Nós defendemos a democratização do espaço digital, que Mark Zuckerberg já está tentando colonizar." Para ela, não se deve permitir que um privilegiado bilionário tecnológico estabeleça seu domínio sobre o metaverso, este deve permanecer um espaço descentralizado sobre o qual ninguém governa. "É uma oportunidade muito excitante, tanto para os indivíduos quanto para as indústrias criativas, de ultrapassar as infraestruturas atuais onde os criadores emergentes são afogados pelos conglomerados". Uma aposta que lembra os primórdios da internet e atualiza o velho sonho da democracia digital, em que cada um tem seu lugar e cada voz seu eco. Ou, como diz Wade Watts, o jovem herói de Jogador Número 1: "As pessoas vêm até OASIS por causa de todas as coisas que podem fazer aqui, mas acabam ficando por causa de tudo o que podem se tornar."

text
Obras virtuais dos artistas Deafbeef e Pak, vendidas pela SHOTEBY'S

Tags

Posts recomendados