Maria Helena Pessôa de Queiroz em entrevista para a L’Officiel
Maria Helena Pessôa de Queiroz mudou o rumo da própria vida há cinco anos e faz sucesso internacional com sua papelaria de alto luxo
Empreender nunca foi um plano, pelo contrário. A carreira de Maria Helena Pessôa de Queiroz, de 33 anos, começou no Direito. Formada pela FGV-Rio, ela trabalhava em escritório, mas não estava se sentindo realizada, quando decidiu viver o sonho de morar fora. Foi para os Estados Unidos fazer um mestrado na Universidade de Duke e, enquanto estava lá, seu computador parou de funcionar. “Fiquei desesperada, pois meu pai sempre foi muito saudosista e montou uma série de álbuns registrando toda a minha história e a do meu irmão, porém com o passar dos anos e avanço da tecnologia, eu mesma fui deixando esse hábito de lado. Foi quando prometi a mim mesma que se eu conseguisse recuperar as fotos do meu computador, retomaria esse hábito para nunca mais passar por isso”, conta ela. Dito e feito, recuperou toda a memória do HD e começou a pesquisar álbuns para dar continuidade aos registros do pai, mas nada parecia interessante o suficiente perto do seu imaginário. Quando retornou ao Brasil, muito grata pela experiência em Duke, mas ainda descontente com o Direito, começou a fazer cursos de toda natureza para tentar traçar um plano B de carreira. “Foi quando lembrei da ideia de fazer álbuns que fossem esteticamente muito desejáveis. Eu me matriculei em um curso de encadernação e aos poucos fui recebendo encomendas de amigas e pessoas próximas, até que ficou insustentável a rotina de escritório e pedidos.” Em 2016, nasceu a MH Handmade Memories – hoje MH Studios – uma papelaria especializada em álbuns de fotografia personalizados que cresceu para ser uma marca de objetos de luxo.
L'OFFICIEL: A MH Studios firmou parcerias de sucesso no mercado de luxo internacional. O empreendedorismo é feito de conexões?
Certamente, mas não só o empreendedorismo. Grande parte das profissões envolve conhecer gente, trabalhar seu network. Como advogada, por exemplo, era importante que eu trouxesse clientes e suas causas para o escritório e, para isso acontecer, é preciso estabelecer uma relação com as pessoas. Para essas conexões, não basta nascer no meio mais favorável. Se você não for interessado, curioso, sociável, não tiver social skills para começar uma conversa, bagagem e assunto para se relacionar com as pessoas, de nada adianta.
Como foi convidada a participar da pop-up store da Moda Operandi, em Nova York?
Eu havia acabado de voltar de uma viagem a Londres quando estava sentada à minha mesa, abri o Instagram e tinha uma mensagem da própria Lauren Santo Domingo, uma das empreendedoras que eu mais admiro e me inspiro. A mensagem dizia que ela havia adorado meu trabalho e que gostaria de me dar um espaço na sua pop-up store em Nova York. Nunca tínhamos nos falado. A mensagem era bem direta, ela sabia o que queria. Quando ela soube que eu estava no Brasil, sugeriu que fizéssemos uma reunião virtual. Mas eu não sou boba. Sabe a pergunta que você fez ali em cima sobre conexões? Pois bem, nada substitui estar ao vivo, olhar no olho da outra pessoa e, claro, nosso produto já é lindo em foto (como as que ela viu), mas eu sabia que ela precisava tocar nele, viver essa experiência. Não pensei duas vezes. Apesar de recém-chegada ao Brasil e com carnaval acontecendo em três dias (e amigas convidadas para ficarem na minha casa), cancelei todos os planos e voei para NY e lá passei duas horas numa sala conversando com a própria Lauren Santo Domingo.
E como saltou aos olhos da Hermès?
Foi curioso isso. Sempre tive paixão pela Hermès, quando penso em luxo, discrição, sofisticação, tradição, nada ganha dessa maison. Sempre que viajo, entro nas lojas para ver a decoração, vitrine... Sempre foi uma fonte de inspiração. Muita gente já me ouviu falar que meu sonho é ser a Hermès da papelaria. Pois bem. Era 2020, eu estava em Nantes quando vi uma vitrine e fiz uma foto, postei no stories. Normal, como sempre faço. E aí, por coincidência, naquele mesmo dia, o pessoal de marketing da Hermès me liga e pede uma reunião – e o que ouvi lá, guardo comigo pra sempre! Eles explicaram o projeto e disseram que a Hermès se associa apenas com quem carrega a mesma essência do trabalho artesanal, sofisticado, luxuoso porém discreto, original e artístico. E que não só MH Studios refletia o espírito Hermès, mas também a minha pessoa física (quase desmaiei nesse momento, como você pode imaginar), a minha forma de me portar, de ver a vida. O que mais posso dizer?
Quais os diferenciais dos produtos da MH? Como conta histórias por meio deles?
Primeiramente, todos os produtos têm uma história. Nenhum deles nasceu do intuito de vender. Eles nasceram de uma necessidade minha e por não encontrar nada no mercado. Segundo, a vida fez de mim uma pessoa que adora contar histórias. Além de amar tudo que envolve arte e criação, sempre amei ler, escrever e fui me tornando uma contadora de histórias, sem querer. Hoje os clientes que vão até a MH buscam um olhar específico, uma assinatura e a minha capacidade de contar a história deles de forma única e artística. Eles querem ver a história deles sendo contada por mim. Tudo que a MH produz reflete a minha educação, as minhas influências de arte, de vida, vivências. E isso é só meu.
O que os fez serem notados pelo mercado? Qual o carro-chefe da marca?
Acho que só o fato de ter decidido comercializar algo que até então havia entrado em extinção já chamou a atenção. Segundo: a arte que os álbuns carregam. Terceiro: a MH fez muita gente abrir os olhos para o que realmente importa, olhar para o lado afetivo das coisas, para sua própria história, valorizar mais o momento, as memórias, as vivências, do que colecionar bens materiais. Todos os trabalhos feitos pela MH carregam um DNA muito próprio, um olhar único, facilmente identificável. Além disso, são artes intrincadas, técnicas artesanais que fazem nascer produtos bastante sofisticados. Os álbuns de fotografia certamente são o nosso carro-chefe, mas temos por exemplo lista de espera de meses para nosso Trent Planner, a agenda da MH. Todos os produtos são muito procurados.
Onde busca inspiração, referências?
Eu sou constantemente inspirada pelas referências ao meu redor – seja na arte, na literatura, seja no teatro ou na natureza. Parece generalista, mas essa é a realidade. Às vezes, eu queria que minha cabeça descansasse um pouco, mas a verdade é que para onde eu olho eu vejo algo, penso algo, o dia inteiro. E por isso vivo com um caderno à mão para anotar, porque sou influenciada o dia todo.
Como imprime o olhar feminino na MH?
É muito natural, faço aquilo que reflete o meu olhar, meu gosto, o que me satisfaz, aquilo que eu compraria. Acontece então de forma muito intuitiva, sigo o que faz meu coração bater mais forte. Por isso sempre digo que a MH Studios é a extensão do meu olhar, é a Maria Helena pessoa jurídica.
Quais os próximos desafios da MH?
Escalar sem perder a essência, aumentar nossa presença internacional e ampliar o portfólio de produtos.
Como equilibrar vida pessoal e vida profissional?
Engraçado que à medida que a empresa ia crescendo e íamos contratando mais pessoas, eu achava que ficaria mais tranquila, com mais tempo, mas a verdade é que, junto desse crescimento, outros desafios chegam e você está sempre atolada de trabalho. E acredito que isso é inevitável quando uma empresa está começando, pois ela exige tudo de você. Acho importante dizer que eu não sou aquela pessoa que gosta de falar que está sempre ocupada, sugada pelo trabalho. Sempre tive preguiça daqueles discursos que lia por aí “fulano não tirou férias por dez anos”. Acho crucial se organizar para ter momentos de lazer, de ócio, sobretudo para que a cabeça se mantenha pensante e criativa. Mas, como disse, essa dinâmica é bem complicada. Há quatro anos passei a acordar às 5 da manhã – foi a forma que encontrei de adicionar horas ao meu dia para que pudesse fazer coisas que adoro, mas estava sem tempo por conta do trabalho (aula de inglês, francês, exercício, ler, meditar). Viajar é a minha paixão e é o que me mantém com a cabeça a mil, cheia de ideias, por isso me organizei para conseguir passar alguns meses do ano fora (maior luxo para mim!). É difícil, cansativo, exige uma disciplina e organização atroz, mas é possível.
Quais suas resoluções para 2022?
Proteger ainda mais minha energia: sim, eu sou a pessoa que acredita e dá muito valor a isso. Deixar perto de mim apenas quem eleva essa energia. Aprender a dizer mais não. Ainda tenho dificuldade em desagradar as pessoas e acabo absorvendo muito trabalho e coisas que eu não queria de fato fazer. Tentar encontrar mais tempo para não fazer nada.