Ator e diretor Adanilo rompe com os estereótipos sobre o Norte do Brasil
Conexão Rio-Manaus! Rompendo com os estereótipos sobre o Norte do Brasil, o ator Adanilo interpreta personagens raros na tevê, no streaming e no cinema.
Do Amazonas, as narrativas são quase sempre antagônicas e impessoais. É a riqueza da maior floresta tropical do mundo contra os problemas socioambientais, o desmatamento, as queimadas, a grilagem e a mineração. Nessa dicotomia, perde-se a história dos 3,9 milhões de brasileiros que vivem na região. Como parte de um movimento, o ator e dramaturgo Adanilo, 33 anos, quebra o ciclo da pouca representatividade com seus personagens e sua referência à cultura urbana dos manauaras, que envolve o ímpeto de luta e os modos de vestir e de falar.
Mas, como nada é óbvio, o ator não recorre às representações simplistas do Amazonas. “A tradição é muito importante, porém o tempo passou para todo mundo. Passou para aqueles povos que tiveram o privilégio de viver isolados e sem contato com outras sociedades. O tempo passou para a gente também [que precisou migrar]”, conta.
Adanilo é a intersecção entre mundos paralelos. De um lado, é descendente dos povos originários do Baixo Solimões e do Baixo Tapajós. Mais especificamente, os seus antepassados estão ligados ao povo munduruku, com o qual estreita laços. Da outra ponta, carrega vivências de Compensa, bairro da periferia. “Sou uma pessoa indígena, nascida e criada no contexto periférico da cidade de Manaus”, resume. Tal complexidade dá um nó em quem pensa que tudo é constante e que os nortistas somente podem ser imaginados com cocares e sem nuances.
Com tanta história para ser contada, o ator encara logo três diferentes papéis. O primeiro é Sidney, um motorista de ônibus da Viação Formosa, na novela “Volta por Cima”, da Globo, exibida no horário das 19h. Embora tenha nascido no Norte, ele se mudou para o subúrbio carioca, onde toca em roda de samba e gosta de carnaval de rua. O “detalhe” de ambos compartilharem as mesmas origens foi algo sugerido pelo próprio ator.
Enquanto o Sidney é leve e bem-humorado, o personagem Floresta, da série “Um Dia Qualquer”, caminha na criminalidade, na segunda temporada que recém estreou no Max. Ele vem do Norte e trabalhou por anos no garimpo ilegal na Amazônia, mas entra para o tráfico de drogas quando chega ao Rio de Janeiro. Sem previsão de lançamento nos cinemas brasileiros, Adanilo também está presente no filme argentino “Eureka”, do diretor Lisandro Alonso. No longa, exibido em Cannes, ele dá vida a um tipo mais comum no imaginário popular, já que é parte de uma comunidade indígena da Amazônia. Entretanto, há uma reviravolta: Adanilo sai da aldeia e vai para o garimpo no auge dos anos 1970, durante a ditadura militar.
Apesar da coincidência em interpretar tipos incomuns na dramaturgia brasileira, o artista não se limita à figura de ser apenas o homem do Amazonas. Já ganhou destaque ao tornar famoso o baiano Deocleciano, que apareceu na primeira fase da novela “Renascer”. “Interessa-me muito, como ator, viver outras realidades”, avisa.
FORA DA PONTE AÉREA
Com as gravações de “Volta por Cima”, Adanilo está morando no Rio, onde aproveita para curtir a praia, o mar, as trilhas e tudo o mais que a Cidade Maravilhosa oferece. Mesmo assim, a sua casa segue sendo em Manaus. O eixo que liga a capital fluminense ao Norte do País existe na relação de trabalho e está longe de se transformar numa espécie de “Rio-São Paulo”, caminho comum para muitos expoentes da dramaturgia. A trajetória dele é, com frequência, para dentro do Brasil, em busca de inspiração, de conexão e da família.
A cerca de 140 quilômetros da capital do Amazonas, em um sítio na estrada para o município de Novo Airão, residem os pais do ator, Amiraldo e Eunice. “Eles estão em uma relação direta com a terra, de plantar, de colher, de comer aquilo que se planta e que se cria”, conta. Pouco mais distante, em Urucurituba estão outros dos seus familiares. “É preciso pegar um barco. São várias horas viajando”, explica sobre o trânsito que acontece pelos rios.
Da infância, as lembranças mais fortes são da relação com a natureza, com a floresta e com o rio. “Já na cidade, eram outras experiências. Ali, a arte é latente e se manifesta de diversas maneiras”, explica ele, que experimentou o carimbó, o hip-hop e o grafite. De Compensa até o maior festival de cinema do mundo, a trajetória do ator foi modificada pela paternidade. Há seis anos, o nascimento da filha Léa o ajudou a se aterrar mais e o colocou em definitivo “na dinâmica do jogo, que é existir neste planeta em transformação”.