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Rafael Cortez fala sobre virada de chave na carreira, CQC e mais

Rafael Cortez, ex-integrante do programa CQC, fala abertamente com a L’Officiel sobre virada de chave na carreira, afastamento da comédia, melhores momentos no CQC e sua nova versão como pai

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Rafael Cortez | Foto: Gustavo Ferri

Rafael Cortez é um verdadeiro camaleão do entretenimento. Jornalista, comediante, músico, escritor e agora palestrante, ele já percorreu todos os cantos da mídia, do humor afiado do CQC às palestras corporativas sobre vida profissional. Com 31 anos de carreira, Cortez aprendeu a se reinventar sem perder sua essência – e, como ele mesmo define, trocando a evidência pela relevância. Seja arrancando risadas, fazendo entrevistas ousadas ou escrevendo sobre transformação, ele nunca se acomodou no óbvio.

Em bate-papo exclusivo com a L'Officiel Hommes Brasil, Rafael relembra momentos icônicos, desde o perrengue quase diplomático na Copa do Mundo de 2010 até os desafios de se manter em alta no stand-up. Abre o jogo sobre sua nova fase como pai, o impacto disso em sua arte e a vontade persistente de fazer novela – um projeto que, apesar da resistência das emissoras, ele não descarta. Entre risadas e reflexões, ele prova que sua trajetória segue na base da atitude, coragem e resiliência! Leia a seguir:

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Foto: Gustavo Ferri

Rafael, 31 anos de carreira é muita coisa! Se você pudesse resumir esse tempo em um tweet de 280 caracteres, como seria?

Minha carreira até agora, segue na base no “nada é, tudo está”. Sou agora mais relevante do que evidente, por exemplo. A coincidência nestes anos todos reside na Atitude, Coragem e Resiliência!

   

O CQC foi um divisor de águas na sua trajetória. Quais foram os momentos mais loucos e inesquecíveis que você viveu no programa? E tem algum perrengue que só de lembrar dá um alívio por ter sobrevivido?

Eu acho que uma experiência que resume muita coisa que foi de fato incrível, foi a Copa do Mundo de 2010, onde eu fui cobrir os jogos lá em Joanesburgo e África do Sul, e eu fiquei lá 36 dias morando na África do Sul, cobrindo futebol, que é um tema que eu não tenho familiaridade, que eu não gosto de cobrir, que não tem a ver com o meu mundo… eu não jogo, eu não tenho um time, eu não tenho nenhuma relação e aquilo somente muito ruim por conta do contexto, porque eu estava afastado do meu país. 

Mas foi um momento em que eu estava ganhando dinheiro com a comédia stand up, que eu estava cheio de trabalhos paralelos acontecendo, estava na crista da onda, precisando desfrutar da popularidade do programa no Brasil. Esse aspecto foi ruim, me afastar do país, ainda mais em prol de um esporte que eu não tenho familiaridade, que eu não gosto, apesar de respeitar. Mas foi muito bom, porque uma vez que eu estava lá, eu não tinha escolha, eu fazia matérias bem, ou deixava todo mundo ciente de que eu não estava feliz, e entregava um péssimo conteúdo, e eu optei por fazer uma cobertura dinâmica incrível, e usei todo o meu desgosto, toda a minha frustração a favor de uma cobertura incrível mesmo. Eu tenho muito orgulho daquelas matérias que eu fiz na Copa do Mundo de 2010.

Perrengue que só de lembrar dar um alívio por ter sobrevivido? Ah, lá na Copa do Mundo de 2010, a gente invadiu o camarote do presidente da África do Sul, Jacob Zuma, e fomos flagrados pelo chefe de segurança deles, um homem enorme, muito educado, mas muito duro e ele quase levou a gente preso, a gente teve uma longa negociação ali porque a gente fez um crime de segurança nacional e a gente entendeu que se a gente fosse preso ia ser uma coisa muito ruim pra nós, a gente talvez fosse extraditado, confinado numa cela, não sei o que aconteceu com a gente… mas com o jogo de cintura a gente conseguiu sair daquela situação e até hoje eu me sinto aliviado de não ter sido preso na África do Sul.

Fui perdendo evidência. 

Você diminuiu o ritmo como comediante nos últimos tempos. O que te fez pisar no freio? E agora, com o stand-up em cartaz, podemos esperar um retorno definitivo ao humor?

Sendo bem sincero, o que me fez pisar no freio foi uma constatação de que eu não tava conseguindo renovar meu público. O público veio muito comigo quando eu era uma novidade, quando eu era um cara conhecido da TV e o CQC era relevante. A medida que o CQC foi ficando menos prestigiado, foi consequentemente acabando, eu fui envelhecendo e também não fiz toda e qualquer artimanha para permanecer na mídia, para ficar na TV aberta… eu fui perdendo evidência. 

À medida que foi acontecendo, o público não foi mais embarcando na minha vibe de comediante. Eu também não me renovei muito como comediante, eu não tenho essa preocupação de me renovar como comediante. Porque se isso fosse necessário na minha vida, eu faria piadas factuais, eu olharia o contexto sociopolítico, as notícias e faria piadas em cima disso. Eu não sou um comediante factual. Eu sou um comediante de repertório, eu tenho um repertório de um show bom e eu fico reproduzindo esse repertório há muito tempo e deixando ele melhor ainda. Eu não tenho essa ambição como comediante de me renovar e nem de ler o mundo sob a minha lógica do humor. Então acho que teve essa dupla jornada aí, né? 

Um bastão de sucesso que saiu da minha mão e foi passar para mão de outros projetos, outros humoristas e outros programas, agravado pelo fato de que eu também não me reciclo como comediante. Então eu tive que pisar no freio porque eu passei a não vender mais tanto ingresso. Foram tantos shows cancelados porque eu não estava conseguindo vender ingresso. E aí eu falei, “Puxa, não vale mais a pena botar toda a minha energia para viajar com comédia stand-up pelo Brasil porque eu não estou mais tendo demanda para isso”. Era muito frustrante você abrir uma sessão em Florianópolis e perto do show a gente falar: “Olha, não está vendendo ingresso, vamos cancelar”. Sabe? Então eu fui focar em outras coisas. 

Uma das coisas que eu fui focar foi fazer muito bem feito o show residente da minha cidade, que é o que eu gosto de fazer. Em meia hora eu chego no espaço onde me apresento, meia hora depois do show eu já estou na minha casa. Eu tenho filha, sou casado, tenho uma preocupação genuína agora de estar mais presente. E eu voltei a viajar ao Brasil, inclusive, mas com palestra. Então a palestra voltou a me colocar nas capitais, voltou a me fazer correr esse país. Então eu posso focar o stand-up na minha cidade, coisa que eu nunca dei muita bola, sabe? Eu moro em São Paulo há 49 anos desde que eu nasci e eu fiz poucas apresentações aqui, então é hora de ficar aqui. E eu estou muito contente assim.

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Foto: Gustavo Ferri

Seu livro lançado em 2024, ‘Atitude Transformadora’, fala sobre proatividade na carreira. Tem algum momento em que a sua atitude mudou completamente o rumo de um trabalho?

Sim, tem um momento que tá contado no livro, que eu contei em várias entrevistas, que é um dos momentos mais bonitos da minha carreira e eu faço questão de contar pra você: quando eu fui chamado pra fazer parte do CQC, me queriam como produtora do programa. E foi a minha iniciativa de me ver em um outro lugar, de ambicionar uma coisa diferente e de brigar por esse lugar que me possibilitou ser repórter, porque quando me chamaram pra ser produtor, eu olhei para aquele trabalho, vi os vídeos dos programas no Chile, na Argentina, e à medida que eu vi aqueles repórteres entrevistando as pessoas, eu pensava, por que eu vou ser produtor disso aqui se eu sou, obviamente, repórter? 

Eu tive muita atitude de chegar na reunião admissional da vaga de produção e dizer pro meu chefe: “Olha, vim negar essa vaga e eu vim aqui pra dizer que você tem que me testar como seu repórter”. E ele falou: “Mas você não atende nenhum requisito, por que eu deixaria você fazer o teste?”. Eu respondi, se ele deixasse eu fazer o teste, ele veria o melhor teste que ele veria na vida dele. E foi assim que a coisa aconteceu para mim. Isso foi muito legal, das coisas mais bonitas que aconteceu, e recentemente isso aconteceu de novo na minha vida, porque quando eu vi que realmente o telefone não estava mais tocando para convite nenhum de televisão, eu criei a palestra da atitude transformadora e me reinventei, me posicionei como um palestrante e estou indo muito bem assim.

   

Falando em novas fases, você se tornou pai recentemente! Como a chegada da sua filha transformou sua rotina e até seu envolvimento com o humor e carreira?

Ah, transformou completamente, né? Ela passa a ser prioridade. Mesmo que eu tivesse a loucura de não querer que isso acontecesse, não tem como ser muito “fragilzinho”. Agora ela tá com dois anos e meio, já está mais independente, já tem outros caminhos melhorados, tá mais fácil. Mas eu realmente impus novas prioridades. 

Eu comecei a pensar em como ficar mais em casa. Eu também não tenho interesse de ter uma filha e ser um pai ausente. Eu quero que ela tenha memórias da primeira infância e lembre-se do pai dela no meio delas. Eu quero ser um pai de experiências, possibilitando vivências. Isso eu tenho conseguido fazer também porque eu pus o pé um pouco no freio. E olha que eu gosto muito de trabalhar, até que eu estou segurando bem em função dela. E eu tive que rever. Então eu fiz questão de rever meu tipo de trabalho, especialmente meu tipo de humor, depois que eu virei  pai. A real é que eu acho que eu toco melhor, eu sou melhor comediante, eu falo melhor, eu produzo conteúdos melhores depois que a minha filha nasceu, porque eu sempre tenho uma responsabilidade incutida no meu inconsciente, que diz: “Se tua filha estivesse conseguindo ver isso agora, o que ela ia achar dessa piada? Se tua filha tivesse na sua plateia agora? O que ela ia achar desse teu show?”. Então você se cuida.

 

Você já fez de tudo: comédia, jornalismo, música, literatura e até palestra corporativa. Existe algum projeto ‘fora da caixa’ que ainda quer tirar do papel?

Eu tô sempre criando projetos e algumas vezes esses projetos acontecem, outros acontecem mais ou menos e outros simplesmente não decolam. Mas é um projeto que eu tenho muita vontade de fazer que eu não consegui e eu até agora sigo não conseguindo, e muito do que eu não consegui é porque não depende só de mim: é fazer novela. 

Eu não consigo fazer porque as emissoras que produzem novelas não pensam em mim. Para fazer algum papel em alguma novela, eu precisava muito fazer uma novela para dizer que eu fiz tudo na TV. Eu fiz tudo em TV mesmo, até agora. Eu apresentei reality show, eu trabalhei em reality show de confinamento, eu fiz trabalho de competição, eu fiz humor, eu cobri esporte, eu cobri olimpíada, eu cobri Copa do Mundo, eu fiz série, eu fiz jornalismo, eu fiz ficção. Mas eu nunca fiz uma novela e vou continuar sem fazer novela à medida que os produtores de elenco das emissoras não responderem os meus pedidos de pelo menos fazer um teste, e não tô dizendo que eu quero um papel “UAU”, que eu quero uma super oportunidade, eu não tenho essas vaidades… eu quero fazer o teste, mas eles não retornam aí fica complicado.

   

Você mencionou que já está pensando no seu próximo livro, que será um romance. Dá para adiantar um pouquinho do que vem por aí? Mais comédia ou vamos ver uma versão sua mais romântica e profunda?

Pois é, esse novo livro tá  pronto na minha cabeça, mas ele é um vespeiro. É uma história pesada. Acho que vou ter que segurar um pouco para escrever sobre esse livro, porque é um drama. É um livro pesado, e eu preciso continuar trabalhando para as pessoas entenderem uma outra faceta minha. Eu vou precisar de mais um tempo para as pessoas me verem além do humor, e isso é um processo de construção de imagem, de construção de carreira. Porque se eu solto um livro desses agora… é o primeiro que eu acho que ninguém lança. E quem for ler esse livro vai ficar muito mal impressionado, sabe? Porque esse é pesado. Não é a hora. Eu vou ter que segurar um pouquinho aqui, infelizmente.

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Foto: Gustavo Ferri

Nos bastidores da comédia, quem foi a pessoa que mais te surpreendeu positivamente? E tem algum encontro inusitado que virou história para contar no palco?

Olha, de coração, eu acho que nos bastidores da comédia, pensando em gente do meio da comédia, uma figura que mais me surpreendeu positivamente e segue me surpreendendo, é o Danilo Gentili. O Danilo Gentili apareceu como um caipira nos bastidores do CQC. O elenco já estava formado, e aí veio um cara esquisito, desengonçado, falava uma língua do interior, um interiorano de São Bernardo do Campo, que nem é interior, mas ele parecia um “jeca” dentro de São Bernardo, uma cidade superdesenvolvida. 

O Danilo era um estereótipo, um caipira, que entrou pra fazer um quadro. Era um quadro que tinha começo, meio e fim, um repórter inexperiente. Mas ele era tão talentoso que ele se sobressaiu ali muito rapidamente e acabou virando um integrante fixo com o CQC. E pelo tempo que o Danilo Gentili esteve dentro do CQC, ele fez um barulho danado. E ele não ficou muito tempo porque o CQC era pequeno para ele, ele precisava escoar o seu enorme talento fora e ele foi dar vazão ao talk show que ele faz bravamente há todos esses anos. 

Ele começou com o "Agora é tarde" na Band, foi uma ideia que ele teve, eu vi ele desenhando tudo, eu vi ele concebendo tudo, eu vi ele brigando por esse programa, vi a Band comprar esse projeto, e vi ele migrar pra SBT e sigo assistindo cada passo que Danilo Gentili dá, na comédia, né? É um “absurdo”, no ótimo sentido, tá? A palavra não é “absurda”, é um “tesão” o que o Danilo faz. Ele é muito talentoso. De tempo em tempo ele quer uma coisa nova, ele quer o ‘Roda Solta’, um quadro que ele tem ali no ‘The Noite’, que é maravilhoso, que de vez em quando eu participo. Quem vê o ‘Roda Solta’  fala: “O cara que fez  isso aqui tem um parafuso a menos, é alvo de bons estudos”. Esse é  Danilo Gentili, eu tô fazendo essa publicidade gratuita do Danilo, ele nunca vai ficar sabendo que isso aconteceu, porque ele muito low profile, mas ele é ainda o cara que mais me surpreende positivamente na comédia. 

 

Um encontro inusitado? Há muito tempo eu não conto essa história, eu já contei em alguns palcos meus, já contei em uma situação ou outra o que aconteceu entre eu e um ator britânico chamado Anthony Daniels, muito chique e elegante. Anthony Daniels fazia o C-3PO, aquele robô de Star Wars, aquele robô prateado, tinha o C-3PO, que era aquela lata e tinha os R-2D2, que era aquele robô alto. Bom, ele era interpretado por um ator Shakespeareano, que tinha técnicas de mímica, estudado na Royal de Londres, esse era Anthony Daniels. Ele veio ao Brasil uma vez para uma convenção de Star Wars, um pouco antes dessa loucura toda da C-6XP, isso ainda era na época dos testes do CQC, ou seja, foi logo no comecinho de 2008 ou finalzinho de 2007, e eu fui escalado pra cobrir essa convenção e entrevistar o Anthony Daniels. Eu fiquei nervoso na hora de entrevistá-lo porque eu tinha muito pouca experiência, a entrevista era em inglês, eu falava muito pior em inglês do que eu falo hoje, e eu confundi uma palavra muito importante que deu um duplo sentido horrível à pergunta, e ele ficou muito ofendido, com toda razão, e interrompeu a entrevista, deu uns gritos, disse que não ia dar mais nenhuma entrevista pra nenhum jornalista naquele dia, toda a imprensa que estava presente ficou furiosa comigo, os fãs também.

Eu fiquei esperando o Anthony Daniels ir embora, e eu o abordei no estacionamento para pedir desculpa, eu estava tão nervoso que em vez de pedir desculpa “I am Sorry”,  desculpe pelo meu erro, eu falava assim, “Don't be afraid, I'm sorry.” Eu queria dizer, “Poxa, não fique chateado, eu não sou sem noção, eu não sou perigoso”. Eu infelizmente não posso dizer quais foram as palavras que eu confundi, mas pode ter certeza, que levaram a um sentido sexual absolutamente horrível, que ofendeu profundamente um ator londrino septuagenário como ele, com toda razão.

PING PONG

Uma piada que sempre funciona no stand-up?

Ao interagir com um casal que está casado há muitos anos, perguntar: “Ah, 30 anos de casado? Como é não ter sexo há 25?”

Uma vergonha que você já passou no palco?

Errar o nome da cidade. E isso aconteceu umas duas vezes já!

O melhor conselho que já recebeu na vida?

Não acredite nem no sucesso e nem no fracasso. Os dois são impostores! — Quem me disse isso foi o lendário Antonio Abujamra.

Se pudesse reviver um momento do CQC, qual seria?

A emoção de receber a ótima notícia de que havia passado nos testes e que minha vida finalmente iria mudar.

Um hábito que ninguém imagina que você tem?

Lixar minhas unhas da mão direita todos, mas todos os dias. Tenho lixas usadas em todos os bolsos das minhas roupas, em todas as gavetas e até no carro. Toco violão clássico e preciso delas polidas para tocar bonito.

Um lema para quem quer transformar a carreira?

Não espere o telefone tocar com projetos que não lembram de você. Faça com que ele toque a partir dos produtos que você crie!

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