Hommes

Tito Ferrara retrata a poesia no caos urbano

O encontro entre gente e bicho mostra a simbiose do portfólio de Tito Ferrara, grafiteiro paulistano que prova que até no caos existe poesia

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Foto: Divulgação

Tito Ferrara sempre gostou de desenhar retratos e animais. Conhecer as pessoas, as suas histórias e experiências, e conseguir concentrar tudo isso em uma expressão fascina o artista de 37 anos. “Cada pessoa é um pequeno universo”, reflete. “O mais interessante é que o retrato é como se você estivesse congelando as pessoas naquele momento, todas as vivências dela naquele instante estão eternizadas.” Os animais, Tito gosta de inserir no cenário urbano, nas ruas e no caos das metrópoles, como se fossem protagonizar uma invasão. Essa junção resume um pouco a maneira como o artista paulistano, nascido e crescido na Zona Sul da capital – na região de Santo Amaro –, encara o mundo. Tito começou a desenhar muito cedo, sempre de maneira autodidata. Aos 15 anos, passou a andar de skate e se encantou com o universo do grafite. “Fiz as primeiras pinturas na rua e não parei mais”, conta. Esse deslumbramento vem da ancestralidade primordial que ele entende como uma ligação com os primeiros homens. “Desde os primórdios, quando o pessoal das cavernas desenhava, era como se fosse um grito de ‘eu passei por aqui’, quase um ‘eu existo’. Na cidade, é uma continuação disso”, explica. Das grutas para o viés cosmopolita, o artista faz uma ponte poética para lembrar que o grafite também é uma forma de inserir arte no cotidiano brutal e infinito dos grandes centros urbanos.

É para quem pega ônibus, quem anda a pé pelas ruas e para quem olha tudo pelo movimento do carro, que Tito cria enormes painéis, hoje distribuídos por todo o Brasil, do Piauí ao Rio Grande do Sul, passando, por São Paulo. “A questão é você parar um segundo do seu dia para pensar, refletir um pouco mais, se aprofundar a partir de uma coisa que você viu na rua... Depois de um tempo, comecei a entender esse outro lado da arte, a cogitar sobre a importância de democratizar a arte. Por mais que seja clichê falar que antes era limitado à galeria e aos ambientes fechados, a arte de rua permite a exposição para mais pessoas no dia a dia.”

Foto: Divulgação

“DESDE os PRIMÓRDIOS, QUANDO o PESSOAL das CAVERNAS DESENHAVA, ERA COMO se FOSSE um GRITO de ‘EU PASSEI POR AQUI’, QUASE um ‘EU EXISTO’. Na CIDADE, é UMA CONTINUAÇÃO DISSO”

Foto: Divulgação

Tito também tem incorporado uma nova maneira de trabalhar, um método que ele chama de “imersões”. Trata-se de passar um tempo, que pode variar de dias a meses, em uma comunidade para interagir e deixar brotar as obras. Uma das mais recentes foi  em uma aldeia kayapó próxima a Novo Progresso, na Amazônia paraense, em 2021. Foram três semanas de convivência intensa com os indígenas para voltar de lá com uma série de trabalhos dedicados aos povos originários do Brasil. O artista já havia feito algumas submersões em aldeias do estado de São Paulo. Mas, dessa vez, a repercussão foi maior. “Foi incrível. O que me motiva a democratizar a arte são exatamente esses conhecimentos, o encontro de pessoas, lugares e a possibilidade de transmitir toda essa particularidade para a minha obra”, explica.

Da experiência com os kayapós, o artista produziu uma série de trabalhos, inclusive um painel para a Organização das Nações Unidas (ONU) realizado na Avenida da Consolação, em São Paulo. A ação faz parte de uma campanha que aborda a devastação provocada pela covid-19 entre os indígenas, especialmente entre os anciãos, a memória histórica dos aldeamentos. O trabalho rendeu outro convite, dessa vez para criar seis painéis em Nova York, um deles na área do World Trade Center e os outros em bairros como Chinatown e Brooklyn. Tito Ferrara também fez uma parada na Cidade do México. Durante duas semanas, pintou imagens de um bairro periférico da capital mexicana para o qual criou um painel que tenta refletir sobre as relações entre os países da América Latina. A onça-pintada, animal frequente em muitas obras do artista, também apareceu nos desenhos criados para a população mexicana. Agora, ele quer ir até o Japão. A ideia é mergulhar nas próprias raízes, já que o grafiteiro tem ascendência japonesa por parte de mãe. Para se preparar, ele tem desenhado rostos mestiços, retratos nos quais encontra, de alguma forma, a sua própria história

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