Moda

A roupa tá on: a moda da nova geração no mundo digital

Entre filtros de redes sociais e proposições artísticas, a moda vai atravessando o mundo digital por uma nova fronteira.
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Por muito tempo a moda se viu estagnada na busca de experimentações. Enquanto as possibilidades de silhuetas já pareciam esgotadas e as referências de décadas eram revistas a cada movimento de tendências, a criação tecnológica se esforçava para desenvolver opções têxteis e a discussão se encaminhou para o mundo da sustentabilidade dentro de uma indústria hiperprodutiva.

Tudo isso, porém, sempre manteve as cabeças voltadas para o costumeiro mundo físico. Agora, com novas gerações de criadores tomando as rédeas e os avanços viáveis da modelagem 3D no computador de casa, essas expressões atravessaram o espelho e entraram no mundo virtual com força e vontade de misturar de vez o real e o abstrato. Tecnologias como filtros de redes sociais, gadgets poderosos e a lógica da realidade aumentada, aliadas à quarentena vivida em frente às telas, aumentaram exponencialmente essas aplicações.

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Vestido da coleção virtual do estilista. Foto: Divulgação

É como se fosse uma resposta direta ao movimento que trouxe a moda de volta ao fazer slow, manual e com foco no upcycling. Em contrapartida, no ambiente que vem sendo batizado de metaverso, as possibilidades são infinitas, não dependem de matéria-prima nem precisam respeitar bobagens como as leis da física. Uma idealização de espaço virtual maleável e habitável, essa ideia de metaverso não é nova – no começo dos anos 2000, por exemplo, o Second Life já ensaiava um passo nesse sentido. A novidade é que a interação entre o físico e o virtual tem perdi - do suas barreiras, muito por conta do avanço do 5G – e chamado atenção das grandes marcas. ” Não gosto da palavra ‘evolução’, pois não vejo as coisas como uma ascendência, mas como modificações horizontais que reorganizam a forma de a gente viver”, define Olivia Merquior, fundadora do Brazil Immersive Fashion Week, evento especializado nessas tangências digitais que deve ter edição phygital em outubro. “Como moda é comunicação, também vai ser implantada por esses novos canais. E nós já temos uma geração completamente educada para entender isso.”

A primeira entrada poderosa foi via mundo dos games, quando a moda abriu o olho para um público que vive (e gasta) no universo das franquias de jogos e que soma, só na China, meio bilhão de players. O crescente faturamento anual dessa indústria tem previsão de ultrapassar os 200 bilhões de dólares em 2023 – números que explicam por que a Louis Vuitton, por exemplo, criou opções de skins premium assinadas por Nicolas Ghesquière para personagens de League of Legends, um dos esports mais disputados do mundo.

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Vestido da coleção viritual do estilista. Foto: Divulgação

Em paralelo, as aplicações 3D aliadas à realidade aumenta da proporcionada pelas câmeras dos smartphones libertaram as grifes para a criação de roupas que são perfeitamente modeladas no corpo. Até então, essas ideias estavam restritas a soluções do varejo e provadores virtuais de pequenas peças, como óculos. Hoje, com a massificação das redes sociais e o tempo cada vez maior que gastamos com as telas – que chega a três horas e meia diárias na América do Sul –, o filão das roupas virtuais se estabeleceu de vez. Saem de cena os aspectos utilitários das roupas, como a proteção contra o clima, e o foco vai para a pura expressão estética. “É como se a roupa digital viesse para cumprir esse papel emocional e subjetivo”, analisa o escritor André Carvalhal. “Algumas pessoas vão usar para se divertir, outras para se expressar, para dizer que estão na moda. Tudo o que elas fariam com uma roupa ‘de verdade’, mas com a vantagem de não gerar uma série de impactos ambientais e sociais.”

As ucranianas Daria Shapovalova e Natalia Modenova perceberam que a moda digital tinha um bom futuro ao notar uma mudança forte de comportamento do consumo de moda por conta da vida narrada pelo Instagram: “Nossas pesquisas concluíram que 9% dos consumidores compravam roupas novas apenas para uma foto para as redes sociais”. A solução foi a startup DressX, loja on-line que vende apenas roupas virtuais e, com menos de um ano de atividade, já tem mil peças à disposição – de cachecóis e camisetas estampadas a vestidos ultradramáticos que nem existiriam em nosso velho mundo real. Os planos de negócios da dupla não são corriqueiros e mostram o potencial da empreitada: “Queremos vender 1 bilhão de itens em dez anos”.

 

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Fotos: Divulgação

Apesar dos avanços tecnológicos, a aplicação ainda é praticamente manual. Quem compra deve enviar uma boa opção de foto para que o time modele via softwares o look escolhido no corpo e deixe a imagem pronta para ser exibida em sua rede social favorita. Já itens com interações mais simples, como tênis, podem ser transformados em filtros que já estamos acostumados a conviver no Instagram, por exemplo – algo que permitiu à Gucci colocar à venda seus primeiros sneakers virtuais, neste ano, por menos de 20 dólares – uma imensa pechincha para os padrões do mercado de luxo.

Por aqui, um movimento pioneiro acontece via Shop2gether, que escalou o carioca Lucas Leão para vender roupas em realidade virtual na plataforma. O portfólio experimental tem duas opções de vestidos de alça com saia de texturas volumosas e uma maxijaqueta esportiva, prontas para vestir a realidade do metaverso, além de uma camiseta física com estampas alteráveis na câmera do smartphone.

Leão é forte representante desse mundo híbrido no Brasil e leva sua marca como um laboratório de experimentações para valorizar o trabalho de artistas digitais. “A moda está percebendo esse lado ainda pouco explorado, então surgem novas possibilidades nessa unificação. Vejo como um exercício para ver o mundo de novas maneiras, uma experiência de expressões”, define. O criador, que já fez apresentações de coleção com avatares 3D, ganha uma exposição retrospectiva no metaverso a partir de 17 de junho. A ação, proposta pelo BRIFW, vai dar detalhes de seu processo de criação no ambiente 100% virtual, ajudando a expandir a consciência de quem não entende muito bem essa ideia de “roupa que não existe”.

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