Claire Foy: a força e a empatia da estrela de “Entre mulheres”
Estrela de Entre mulheres, filme indicado ao Oscar, dá uma lição sobre vulnerabilidade e sororidade, e nos mostra como a união feminina pode derrubar até as mais resistentes barreiras e enfrentar os piores desafios
É difícil mensurar o quão forte pode ser o impacto de um filme. Alguns são cheios de acontecimentos, cenários grandiosos e figurinos exuberantes, mas mesmo que tenham entretido o público por horas, são esquecidos logo que terminam. Outros, acompanham a gente por toda a vida. Nem sempre são produções grandes, às vezes ficam gravados na nossa memória simplesmente porque nos levam a refletir, a rever nossos conceitos e exercitam a nossa empatia ao nos colocar no lugar de alguém. Essa é a verdadeira magia do cinema, que começa com dois ingredientes secretos: um bom roteiro e personagens bem desenvolvidos.
Entre mulheres, escrito e dirigido por Sarah Polley, que estreia no Brasil no início de março, é uma dessas raridades. Baseado no livro homônimo de Miriam Toews, a trama se passa praticamente dentro de um galpão, em uma vila no meio do nada, no qual um grupo de mulheres de uma comunidade religiosa isolada da sociedade contemporânea se encontra para conversar. De fato, não há grandes
cenas de ação ou de movimento, mas são extremamente emocionais e têm em seu centro os conf litos, as dúvidas e a responsabilidade que este grupo carrega. Cabe a essas mulheres discutir as alternativas e encontrar a solução para todas desta comunidade que vivem em condições abusivas e violentas. Sair? Aceitar e seguir a vida? Ou ficar e brigar? São estes questionamentos que deixam o público quase sem poder piscar os olhos.
O que também ajuda é que este grupo é interpretado por algumas das mais fortes atrizes do momento, entre elas Rooney Mara, Frances McDormand, Jesse Buckley e Claire Foy, que falou com exclusividade à L’Officiel sobre a produção. A atriz britânica de olhos azuis e traços delicados, aos 38 anos, interpreta Salomé, uma mulher de personalidade e opiniões fortes determinada a convencer as outras a permanecerem no vilarejo e brigarem por uma vida melhor. “Ela era uma representante da comunidade, mas também tinha muito amor e compaixão pelas pessoas que faziam parte dela. Da mesma forma em que é alguém muito assertivo em seu ponto de vista, é uma personagem muito fácil de entender”, explica a atriz durante a entrevista por telefone. “Ela parece uma mulher com raiva e este ódio é por uma série de razões.” Ao contrário do comportamento contido e duro que vimos em sua versão da Rainha Elizabeth na série The Crown, Entre mulheres traz um lado seu muito mais vulnerável, desconstruído e às vezes até um pouco agressivo. “Era importante para mim que Salomé não tivesse uma nota só. Queria que fosse claro e notável que ela estava tendo dificuldade com tudo: questionava a sua fé e Deus, tentava entender como ela se sentia a respeito Dele”, explica. “A forma que ela se expressa é porque ela está lutando contra tudo.”
Na maior parte do filme, as mulheres no galpão defendem diferentes possibilidades para a ala feminina da comunidade, ao mesmo tempo que pintam um cenário claro dos desafios a serem enfrentados: se ficam ou se vão embora. Ao se tratar de assuntos de extrema violência e até casos de estupro, o cuidado do roteiro e da direção são essenciais para que o público não fuja da história. “A sensibilidade com a qual Sarah Polley lida com o material tem necessariamente a ver com ela ser mulher, com suas experiências de vida, com o que ela mesma traz, sua falta de julgamento e sua inclusão de tantos tipos diferentes de pessoas e de origens tão diversas”, analisa Claire. “O longa tinha que ser dirigido por uma mulher, pois é inerente ao conhecimento necessário que este grupo de mulheres precisa para atravessar a linha que as limita. ”Além da direção, a atriz comenta que a participação de Dede Gardner e Frances McDormand como produtoras foi fundamental para que a narrativa tivesse o merecido destaque na indústria. “Não acho que [o longa] seria visto [sem a dedicação dessas produtoras] como uma história importante, ou mesmo interessante, por um grande grupo de pessoas.” A produção foi aclamada em alguns dos maiores festivais de cinema do mundo, entre eles Toronto e Telluride, e está indicado para o Oscar nas categorias de Melhor Filme e Melhor Roteiro Adaptado.
“A sensibilidade com a qual Sarah Polley lida com o material tem necessariamente
a ver com ela ser mulher, com suas experiências de vida, com o que ela mesma
traz, sua falta de julgamento e sua inclusão de tantos tipos diferentes de
pessoas e de origens tão diversas” Claire Foy
Mas não foram só as mulheres por trás das câmeras que ganharam a admiração de Claire. Por se tratar de uma história tão dura, foi inevitável que a atriz almejasse desenvolver para si algumas das características de sua personagem tão autêntica e cheia de personalidade. "Eu absolutamente aprendi com Salomé, coisas dela e da relação que tem com as outras mulheres. Ela é muito, muito forte na forma em que se expressa e comunica. É dinâmica, então você sabe o que está pensando e sentindo todo o tempo”, explica. “Ela não tem como esconder as suas emoções e as outras mulheres permitem que seja assim. Elas lhe dão o espaço para articular o que pensa e respeitam sua forma de se comunicar. Ninguém a julga ou leva para o lado pessoal. Elas entendem que este é seu o jeito, que é uma pessoa diferente e que pode se comportar dessa forma. Então eu acho que vou levar estas duas coisas: seu destemor em se expressar e a aceitação de que as mulheres permitem que ela seja quem ela é.