Nicole Kidman fala com exclusividade para L’Officiel Brasil
A atriz fala sobre seu mais recente thriller da Netflix, seu trabalho filantrópico, sua obsessão pelo gênero de terror – e lembra alguns capítulos de sua filmografia
Nicole Kidman fala sobre seu mais recente thriller da Netflix, O Casal Perfeito, seu trabalho filantrópico, sua obsessão pelo gênero de terror – e lembra alguns capítulos de sua filmografia. "Fui educada para tentar sempre aprender e ver perspectivas diferentes. Provavelmente é por isso que viajo tanto. Isso me permite entender melhor como as pessoas veem os seus países em relação ao mundo. Não acredito que existir somente no próprio território seja positivo." Confira!
Nicole Kidman consegue passar de filmes leves de alto orçamento (Aquaman) para cinema de arte (O Sacrifício do Cervo Sagrado) com facilidade. Não é, portanto, nenhuma surpresa que tenha sido escolhida pela AMC Theatres como responsável por fazer com que o público queira voltar aos cinemas – a promoção We Come to This Place for Magic cresceu além do esperado e indefinidamente. Nesta entrevista, nos concentramos em sua carreira e nos novos projetos, incluindo o drama policial da Netflix O Casal Perfeito, com Liev Schreiber, lançado em 5 de setembro, e o thriller erótico Babygirl, com Harris Dickinson e Antonio Banderas, nos cinemas a partir de 20 de dezembro.
É fim de semana de 4 de julho, e no dia do nosso encontro, por zoom, Nicole, aos 57 anos, apresenta-se imediatamente atenta e curiosa. Ela fica fascinada pela arte que serve de pano de fundo para minha residência, uma casa que aluguei para o fim de semana em Fire Island, em Nova York. Nicole me contou que já esteve duas vezes nesta meca gay. “Você foi a alguma festa muito louca?” Respondo que participei de várias só naquele fim de semana. “É isso que acontece lá”, ela responde. A segunda vez que Nicole visitou Fire Island, ela veio de carro para uma festa de 4 de Julho. “Recebi muito amor.” Você já se imaginou andando pela avenida de Fire Island e conhecendo Nicole Kidman? Ela ri e diz: “Eu estava usando um chapéu”. Como se um chapéu pudesse disfarçar com eficácia uma das estrelas de cinema mais imediatamente reconhecíveis.
Ultimamente, ela estrelou séries de televisão de muito sucesso, como Big Little Lies, Expats, The Undoing, e agora O Casal Perfeito, baseado no romance homônimo de Elin Hilderbrand. Nicole interpreta uma escritora famosa que está prestes a casar um de seus três filhos com Amelia Sacks, interpretada por Eve Hewson, que não faz parte da alta sociedade de Greer. Quando um corpo é encontrado na praia no dia do casamento, todos são suspeitos, inclusive ela. “Eu me apaixonei pelo formato longo porque gosto de construir personagens”, diz. “A série tem uma atmosfera cinematográfica. É mais um filme em câmera lenta comparado a um filme, no qual você só tem duas horas para contar a história e construir um personagem.” A dupla perfeita reúne Nicole e a diretora Susanne Bier, que a dirigiu em The Undoing, da HBO. Na última série, a atriz não sabia que era suspeita de assassinato. Nesta, interpreta uma matriarca que pode ter cometido um assassinato. “Greer é incrível. Ela é uma matriarca. É difícil, mas ela é uma mãe ursa. Ela protege seus filhos; ela é muito inteligente e muito complicada. Gosto que seja inescrutável, uma sobrevivente.”
Neste ponto, a atriz já fez quase tudo. Ela foi indicada a cinco Oscars e ganhou um (melhor atriz em 2003 por As Horas), venceu seis das 17 indicações ao Globo de Ouro e levou dois Emmys pela popular série da HBO Big Little Lies. Ela é embaixadora da Unicef desde 1994, embaixadora do Unifem (Fundo das Nações Unidas para o Desenvolvimento para as Mulheres) desde 2006 e embaixadora da marca Balenciaga. Ela mora com o marido, Keith Urban, um cantor country, e suas duas filhas, Sunday e Faith, em Sydney, Nashville e Nova York. “Estou disposta a viajar, o que muitas pessoas não fazem”, diz sobre seu trabalho. “Minhas filhas estão dispostas a viajar... talvez menos agora (que estão mais velhas), mas também estão muito interessadas no mundo. Dizem que têm muitos carimbos no passaporte, mais do que a maioria das pessoas na faixa dos 80 anos. Isso porque quando eram pequenas viveram no Marrocos [onde Nicole filmou A Rainha do Deserto, de Werner Herzog] e depois foram para o deserto da Argélia, onde montaram em camelos e passearam pelos souks durante três meses e meio. Viveram na França, Austrália, Inglaterra, Escócia, Irlanda, Ásia, Vietnã, Hong Kong...”
Nicole vê seu trabalho como parte de sua educação global. “Deu-me um coração empático e uma forma de entrar na vida de pessoas a quem de outra forma nunca teria sido exposta. Eu leio muito. Não creio que existir apenas no próprio território seja positivo. Fui criada para sempre tentar aprender e ver diferentes perspectivas. Provavelmente é por isso que viajo. Permite-me compreender melhor como as pessoas veem o seu país em relação ao mundo. Estou ensinando os meus filhos que o trabalho, mesmo o trabalho solidário, é algo que não diz respeito apenas a você”, afirma. “Estava lendo um artigo muito interessante em que uma mulher doou o rim a uma amiga que não reconheceu o presente. Isso causou uma ruptura entre elas. Quando você faz coisas filantrópicas ou por um bom motivo, não deve esperar nada em troca. Nosso dever e propósito no mundo é ajudar os outros, e não receber tapinhas nas costas por isso.”
“NOSSO dever E PROPÓSITO NO MUNDO É ajudar OS OUTROS, E NÃO RECEBER tapinhas nas COSTAS POR ISSO.”
É por isso que ela tem dificuldade em aceitar prêmios por trabalho humanitário. “Sinto-me profundamente desconfortável”, diz. “Há diferentes momentos em que você tem que aparecer porque significa que mais pessoas vão doar ou que haverá mais luz sobre esse assunto. Não pode ser algo egoísta.” Ela também acredita que os filmes têm a oportunidade de fazer uma mudança positiva no mundo. Depois de interpretar o papel da sobrevivente de violência doméstica Celeste Wright em Big Little Lies, ela teve “muito mais compreensão e conexão com as pessoas que sofreram esse abuso”. Seu papel como Nancy Eamons, esposa de um pregador batista (Russell Crowe), cujo filho (Lucas Hedges) passa por terapia de “conversão” homossexual em Boy Erased: Uma Verdade Anulada, também foi esclarecedor. “Um filme muito pequeno, mas importante para mim. Ele recebeu toda a glória que precisava? Não, mas definitivamente lançou alguma luz [sobre os horrores da terapia de conversão]. Tem muita gente que vem até mim e diz: ‘Obrigado, você ajudou minha família fazendo aquele filme’. Há papéis em que penso: ‘Foi tão difícil, mas a verdadeira aventura foi incrível’. E isso ficou gravado na minha psique de tal forma que posso voltar e sonhar com isso e dizer: eu estava naquele lugar e aquela era eu. Vivi naquelas montanhas, ou naquele deserto, ou em uma tenda, ou andando de camelo, subi uma montanha em Belfast que lembrava o local onde os vikings costumavam frequentar. São coisas que poucas pessoas podem fazer. Caminhei pelas florestas da Suécia no auge do inverno com Lars von Trier [para Dogville, de 2003] pensando: ‘Onde estou? O que estou fazendo?’. Fui à Tailândia, nas profundezas da floresta onde os prisioneiros de guerra foram mantidos durante a Segunda Guerra Mundial [em Uma Longa Viagem, em 2013] e vi as ferrovias que eles construíram. Quando eu teria estado lá?”
ELA FOI indicada A CINCO Oscars E ganhou UM (MELHOR ATRIZ EM 2003 POR As horas), VENCEU SEIS DAS 17 indicações AO Globo de Ouro E LEVOU DOIS Emmys PELA POPULAR SÉRIE DA HBO Big Little Lies.
“VIVI naquelas MONTANHAS, OU NAQUELE deserto, OU EM UMA TENDA, OU ANDANDO DE camelo, SUBI UMA MONTANHA EM Belfast QUE LEMBRAVA O LOCAL ONDE OS vikings COSTUMAVAM FREQUENTAR.”
Um dos destaques do discurso de Nicole no AFI Lifetime Achievement em abril foi quando ela nomeou (quase) todos os diretores com quem trabalhou em sua carreira. Nicole disse que inicialmente queria citar todos os países em que filmou, mas talvez tenha sido um pouco demais. Além disso, ela rapidamente se desculpou por excluir acidentalmente alguns diretores. “Deixei James Wan de fora, o que foi devastador para mim”, diz. Ela trabalhou com Wan em Aquaman, em 2018, e na sequência Aquaman e o Reino Perdido, em 2023, dois filmes de super-heróis alinhados com o exagerado Batman Forever (1995) de Joel Schumacher, a primeira incursão de Nicole no Universo DC Comics.
“TODO MUNDO ME pergunta: ‘POR QUE VOCÊ FAZ ISSO?’. Eu RESPONDO: PORQUE QUERO beijar O BATMAN!” É sobre TENTAR COISAS QUE ELA nunca FEZ ANTES.
O que a intriga ao se dedicar a papéis que, segundo alguns, uma atriz do calibre dela deveria recusar? Sobre Batman Forever, lembra: “Todo mundo me pergunta: ‘Por que você faz isso?’. Eu respondo: porque quero beijar o Batman!”. É sobre tentar coisas que ela nunca fez antes. “O que as pessoas não entendem é que não se trata do cheque. Muitos dos grandes sucessos de bilheteria que faço são diferentes”, diz ela. Na verdade, quando Wan a abordou pela primeira vez sobre Aquaman, ela pensou que era para um projeto de terror. “Eu realmente queria trabalhar com ele em um filme de terror.” Ela estrelou alguns thrillers psicológicos, como Os Outros e Stoker. Digo-lhe que Stoker é um dos meus favoritos, e ela responde: “Ninguém fala de Stoker [dirigido por Park Chan-wook], eu adoro. O monólogo foi a razão pela qual aceitei fazer o papel”. Não é nenhuma surpresa que um monólogo intenso atraia qualquer ator, embora Nicole tenha um talento especial para emoções intensas, como em Reencarnação, quando a câmera permanece na dor em seu rosto por dois minutos. “Em O Homem do Norte não é um monólogo, mas sim uma cena filmada em quase um único plano por Robert Eggers, em que seduzo Alexander Skarsgård no papel da sua mãe. Eu também adoro essa cena. Obviamente sinto as coisas muito, muito profundamente”, diz. “A minha mãe sempre disse que criar-me era criar uma criança muito sensível. Parte da minha jornada de vida é aprender a não ser tão empática com as pessoas a ponto de me destruir ou me sabotar, porque posso irritar a pele e a psique dos outros de uma forma muito estranha. É quase uma atração. Posso manifestá-la física e emocionalmente. Às vezes pode ser assustador.”
O próximo filme, Babygirl, em que Kidman interpreta uma CEO que se envolve em um romance proibido com um funcionário mais jovem (Harris Dickinson), foi “muito difícil porque emocionalmente era muito profundo”. Fazer algo como O Casal Perfeito é, no entanto, um bom equilíbrio. A atriz também adora teatro, embora não suba ao palco desde Photograph 51, de 2015, no West End. “Quero fazer algo em palco, mas neste momento tenho de escolher com cuidado. Não quero ficar doente ou esgotada a ponto de não conseguir ter o meu melhor desempenho. Isso é profundamente honesto com minhas habilidades. O que Lawrence Olivier disse? ‘Tentar atuar?’ Sim, eu atuo, mas ao mesmo tempo há uma parte de mim que, quando ligada ao papel certo, é abrangente e assustadora. Eu tenho que ter cuidado.”
O terror é surpreendentemente um dos gêneros favoritos da atriz. Peço que ela me recomende um filme de terror, e ela prontamente responde: “O australiano, Fale Comigo, você já viu?”. Concordo com a cabeça, dizendo a ela que achei assustador. “Ainda não fiz um filme de terror clássico. Um terror incondicional. Estou sugerindo isso porque assisto terror hardcore. Sou fã de Ti West!”
“PARTE DA minha JORNADA DE VIDA É aprender A NÃO SER TÃO empática COM AS PESSOAS A PONTO DE ME destruir OU ME sabotar.”
TEXTO: Ira Madison III.
FOTOS: Matthew Brookes.
STYLING: Jason Bolden.
CABELO: Adir Abergel.
MAQUIAGEM: Kate Synnott.
ELENCO: Lauren Tabach-Bank.
PRODUÇÃO: Michael “Skiny” Power.
ESTILISTA DE PROPRIEDADE: Jamie Dean.
ASSISTENTES DE FOTOGRAFIA: Kurt Mangum, Kendall Pack e Arden Core.
TECNOLOGIA DIGITAL: Stowe Richards.
ASSISTENTES DO STILYST: Daniel Sepulveda e John Mumblo.
