Cultura

Guilherme Callegari: uma pintura de marca

Do Grande ABC para o coração paulistano, Guilherme Callegari discorre sobre uma arte industrial e cheia de sentimentalismos

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Fotos Filipe Berndt / Divulgação

Guilherme Callegari gosta de dizer que iniciou a carreira aos 3 ou 4 anos, quando brincava com canetinhas e lápis de cor. O desenho infantil pode parecer algo banal, mas é nele que repousa a espontaneidade perdida depois da exposição às regras e normas do mundo adulto. Hoje, aos 36 anos, Callegari não tem pudor em dizer que o seu “corpo de trabalho” vem dessa época, na qual a liberdade propicia um ar de frescor à criatividade. “Não tive uma pausa”, brinca o artista, formado em design gráfico e publicidade, e fascinado pelas possibilidades plásticas do excesso de imagens que invadem o mundo contemporâneo.

O virtuose é um pesquisador de marcas. Atento aos logotipos e à maneira como a arte gráfica é utilizada para conferir identidade e construir narrativas, ele tem a comunicação como base de um trabalho construído com partes iguais de técnica e observação. Quando mais jovem, queria fazer capas de discos e livros. “Uma determinada marca, às vezes, representa um lifestyle e um monte de outras coisas. Às vezes, uma marca fala muito sobre uma pessoa e acho isso curioso. Um símbolo pode representar o estilo de vida de uma pessoa ou a própria pessoa”, diz.

Mas Callegari também é, antes de tudo, um pintor. É na cozinha do ateliê, na mistura de pigmentos e na tela sobre o cavalete que ele monta toda a base de uma linguagem extremamente urbana e contemporânea. “Tenho uma relação forte com a pintura, com a história da pintura, com a pintura da paisagem”, avisa. “E gosto de fazer essa relação da pintura com o design. Pego essas marcas para trabalhar o campo de cor, a textura.” O design funciona como uma espécie de diagramação e a pintura entra como o elemento responsável pela discussão proposta pelo artista.

A discussão, na obra dele, é também uma reflexão. Nascido em Santo André, região do ABC povoada por indústrias e pelo chão de fábrica, na Grande São Paulo, ele cresceu rodeado pelos logotipos da indústria automobilística, presença constante em seus trabalhos. “Sempre andei muito pela cidade, sempre me movimentei, ia para todos lados e via essas fábricas com os totens gigantescos. Isso foi me contaminando. Virou familiar. Depois que abriguei o design na minha pintura, essas marcas entraram sem querer. Pensava nelas de primeira porque estavam ali no meu convívio”, conta o artista, que hoje é representado pela Verve Galeria, um ponto de encontro na cena das artes visuais de São Paulo.

Fotos Filipe Berndt / Divulgação

Para o arquiteto Ian Duarte Lucas, sócio da Verve com Allann Seabra, artista plástico, o trabalho de Callegari debate questões urgentes e pensa em referências tiradas do cotidiano. “Guilherme é jovem, traz esse universo de códigos desse bombardeio de informações que a gente vive. É um pintor erudito e bebe de várias áreas. Somos uma geração muito afetada pela sociedade de consumo, e ele passa isso para a pintura com muita liberdade e naturalidade. É uma baita pintura, mas que não está presa aos cânones”, avalia o galerista.

Fotos Filipe Berndt / Divulgação

Criada em 2013, a Verve tem a proposta de ser menos comercial e mais institucional. A ideia é dar liberdade ao artista e não o pressionar no sentido de uma produção mais vendável. Depois de funcionar em Pinheiros durante sete anos, a galeria mudou de endereço e hoje ocupa um espaço no mezanino do Edifício Louvre, projeto do arquiteto Artacho Jurado e ícone do centro de São Paulo. “Queríamos mudar para a região central e, na pandemia, tivemos a certeza disso”, conta Ian. “A galeria passa a ser um programa, tem todo um circuito cultural em volta e a gente entendeu que seria um movimento interessante pelo momento da cidade. Sempre tivemos esse fascínio pelo centro, que é um lugar de encontro por excelência.”

Fotos Filipe Berndt / Divulgação

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