“Não se Preocupe Querida”: Conversamos com o compositor do filme
A L’Officiel bateu um papo exclusivo com o compositor para saber um pouco mais sobre os bastidores da produção dirigida por Olivia Wilde
O que é a vida sem uma trilha sonora? De todas as disciplinas do cinema, a música é talvez um dos maiores condutores de emoções. Para cada filme, há uma composição criada que ajuda elevar o enredo, as melodias literalmente dão o tom à uma cena. É possível entender se algo vai ser assustador ou romântico, alegre ou triste, simplesmente pelo tipo de som ao fundo da cena.
Ninguém é mais preparado para falar do assunto que John Powell, o compositor por trás de Não Se Preocupe, Querida. Além dos visuais ousados e das renomadas interpretações, a trilha sonora, certamente é um dos pontos fortes do filme que conta com Florence Pugh e Harry Styles como atores principais.
A L’Officiel bateu um papo exclusivo com o compositor para saber um pouco mais sobre os bastidores da produção dirigida por Olivia Wilde.
O que foi mais importante ter em mente ao compor a trilha sonora para Não Se Preocupe, Querida?
O mais interessante é que a composição tinha que interagir com as músicas que já existiam. Essas canções estavam ali para mostrar a alegria e o prazer de estar naquele mundo criado. Como era encantador e divertido ou quão tranquila a sua vida pode ser no que parece ser um mundo perfeito. Então o score obviamente tinha que ajudar no subtexto do que estava para acontecer, por isso eu literalmente compus muita tensão. Você tem uma personagem duvidando de sua sanidade, que então vai atrás para descobrir o que realmente está acontecendo. É um estudo de personagem real, portanto a música tinha que fazer isso também, afinal, essa é a arte.
Como é o processo para criar essa identidade sonora?
A primeira coisa é o que eu chamo os sons de apneia do sono. É quando a pessoa ronca e faz sons engraçados durante o sono. Isso ficou um pouco na minha mente, que sons essa pobre mulher que estava ali deitada numa cama faria. A minha namorada é uma cantora, então também fizemos algumas experiências, por exemplo enquanto ela cantava colocava e tirava a mão sobre a boca, para ilustrar a ideia está sendo calada. Eu gosto dessa manipulação de vozes femininas, que é agressiva, para tentar fazer o som dessa dominância masculina. A partir destes sons a trilha vai se formando e eventualmente essas vozes de fato cantam. Tinha que soar como que havia algo errado neste mundo, mas também destacar essa história de amor, que é toda errada mas é uma.
Como você fez para dar este contraste do romance com o terror?
Usei uma técnica muito popular em filmes de terror com instrumentos de corda, que fica um pouco assustadora deslizando o som. Geralmente a gente faz com música atonal ou não-harmônica. Quando eu encontrei esses sons, eu criei uma lista de 24 acordes românticos, os mais românticos do mundo que eu lembrava e apliquei estas técnicas estranhas em cima deles que gerou sons de cordas muito interessantes que a Olivia aprovou. A gente conseguiu, de certa forma, subverter essa história de amor que de fato é uma história terrível de amor. As vozes das mulheres que gravamos eram como as mulheres que basicamente estavam tentando escapar daquele mundo.
Como você entrou neste projeto?
É engraçado porque quando a Olivia me chamou para trabalhar no filme eu fiquei surpreso, porque não sou o tipo de compositor que estes diretores hipsters geralmente buscam. Mas eu amei tanto o primeiro filme dela (Booksmart) que fiquei curioso para saber como seria o próximo. E eu pude assistir o filme antes de me reunir com ela.
Como funciona esse processo criativo? Você recebeu o filme sem trilha sonora?
Sim, eles me mandam tudo sem trilha, apenas as músicas que já são conhecidas. Eu tento compreender como o filme deve parecer e fazer sentir com uma trilha imaginária na minha cabeça junto a como ela quer que a música seja ou faça. As sensações que ela quer passar no filme, que experiências ela quer que o público tenha ao assistir. Esse é o diferencial do produto sem e com a música. E é dessa comparação que as ideias surgem, porque todos temos o mesmo objetivo final. Como compositor para um filme, eu devo fazer a música com isso em mente. Se eu for escrever apenas o que estou afim, talvez não funcione. Por isso você deve se inspirar pelo próprio filme e seguir a mesma linha dele. Claro que você vai explorar e falhar muito. Há muitos erros nesse processo e o diretor espera que você vá tentar diferentes coisas que não vão dar certo até que se encontre algo que vai.
E como foi a colaboração com a Olivia durante o processo criativo?
Este foi o primeiro filme que ela fez com um compositor, trabalhando lado a lado mesmo para criar a trilha para ela. Eu notei logo de cara quais eram as pessoas que ela se interessava criativamente. Uma das primeiras coisas que mencionei foi Pina Bausch, sempre amei suas coreografias. Eu cresci nessa era de músicas que acompanham estes tipos de dança experimental, além de também ter trabalhado com música para diversas instalações de arte. Então eu sempre escuto danças quando assisto aos filmes. Vejo cenas como dança. E isso é outra coisa que ela gostou, pois é muito interessada em coreografia, então falávamos muito como dança em termos de cinema.
É notável a referência de Pina Bausch no filme em diversos momentos. Como você vê o papel da música no storytelling de um filme?
A música precisa, na maior parte do tempo, tentar concordar ou não com a percepção do público. A dúvida é se há uma diferença entre a história que a platéia espera que vai acontecer ou se é exatamente para dar suporte ao que eles já estão acompanhando. Ou indicar ao público para outro caminho. Se você tem uma conversa entre duas pessoas e de fundo a música é romântica, isso sugere que há algo entre os dois. Se há uma música mais sombria, a sugestão é outra. Isso mesmo quando o diálogo permanece o mesmo, pode indicar que um personagem está mentindo ou que haverá alguma consequência disso no decorrer do filme. Para mim este é o papel da música. Acho que não importa se ela está indo junto ou não da audiência, mas sim deixar o público confortável para se deixar levar por ela. Porque isso tudo é e sempre foi manipulação de emoções.