Rica Kugelmas retornou ao Brasil para dar forma ao espaço ‘auroras’
Rica Kugelmas retornou ao Brasil para dar forma a um dos espaços mais bacanas da capital paulista dentro do segmento – o auroras
Depois de alguns anos de imersão no universo das artes ao lado de Francesco Clemente, Rica Kugelmas retornou ao Brasil para dar forma a um dos espaços mais bacanas da capital paulista dentro do segmento – o auroras. Confira!
Desde 2016, São Paulo tem um espaço em que todos os artistas querem exibir as suas obras. É o auroras, assim mesmo, em caixa baixa, fundado e pilotado por Rica Kugelmas, 46 anos, um ex-advogado, que foi do mercado financeiro e engavetou o terno, a gravata e o escambau ao ser convidado pelo ícone ítalo-americano Francesco Clemente para dirigir seu ateliê no Chelsea, em Nova York, a cidade com a maior concentração de artistas, museus e galerias de arte do mundo. De volta nove anos depois, Rica deu forma ao auroras, que funciona apenas com hora marcada, em uma casa modernista localizada no bairro do Morumbi, área nobre paulistana, que logo emplacou como point alternativo no universo das artes. Apesar de ter um “soft spot” por pintura, ele diz que o que mais o atrai no segmento é o poder de o artista transformar o “nada” em pura poesia. AURORAS.ART.BR
L’OFFICIEL HOMMES Rica, a sua vida nas artes plásticas teve start em Nova York ao dirigir o ateliê do Francesco Clemente. Como isso aconteceu?
RICA KUGELMAS Após dez anos em um grande escritório de advocacia e no mercado financeiro em São Paulo, aceitei o convite do pintor italiano Francesco Clemente para ser diretor de seu ateliê em Nova York. Durante aqueles nove anos, graças à sua generosidade, aprendi grande parte do que sei sobre arte e construí uma rede de amizades com importantes artistas, curadores e escritores, que culminou na minha volta ao Brasil, em 2016, para abrir o auroras. No meio das artes visuais, enquanto a maioria acumula experiências de trabalho em galerias, instituições ou casas de leilão, tive o privilégio de obter conhecimento sobre a dinâmica deste universo fascinante dentro do ateliê de um artista excepcional.
L’OFF Como era o clima da época?
RK Francesco mudou-se para Nova York em 1980, quando a cidade vivia um período de efervescência criativa, e lá construiu a sua vida ao lado da esposa, a artista plástica Alba Clemente, e de seus quatro filhos. Ele trabalha no mesmo loft há 44 anos, um ambiente sagrado, frequentado por nomes ilustres das artes visuais, da música e da literatura. Ali conheci Jasper Johns, Brice Marden, Philip Glass, Lou Reed, Fran Lebowitz, Salman Rushdie, entre outros personagens que ainda definem a cena cultural nova-iorquina.
L’OFF Desde a inauguração do seu espaço, quais são alguns pontos altos que você destaca?
RK Imagino que seja sempre o constante convívio e a troca com artistas brasileiros e internacionais. O auroras teve a honra de apresentar pela primeira vez ao público brasileiro os trabalhos de Cecily Brown, Amy Sillman, Terry Winters, Tom Burr, Sarah Crowner, entre tantos outros; e eles tiveram a oportunidade de conhecer mais sobre a produção dos nossos artistas. Algumas dessas exposições viajaram para museus pelo País, como o MAM da Bahia, Museu Nacional da República, em Brasília, Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre, e Museu AfroBrasil Emanoel Araújo, em São Paulo.
L’OFF Quais são os seus planos da programação para o segundo semestre?
RK Após uma sequência de mostras de artistas brasileiros nos anos de pandemia, nossa programação será muito internacional. Em setembro, faremos a primeira exposição no Brasil da artista conceitual norte-americana Renée Green e, em 2026, traremos nomes importantes como Jacqueline Humphries e Charline von Heyl.
L’OFF Como você, insider, vê o nosso mercado de arte daqui para frente, com a visibilidade alcançada via Adriano Pedrosa, curador da Biennale de Veneza até novembro de 2024?
RK Na verdade, navego mais no universo da produção artística do que no mercado em si, mas assisti a grandes mudanças mercadológicas nos últimos anos. Dentre elas, a questão da diversidade, houve um aumento significativo na participação de artistas e curadores racializados e indígenas no meio das artes visuais. A curadoria do Adriano mostra ao mundo que há maravilhas a serem descobertas quando a pesquisa vai além dos nomes conhecidos, uma das razões pela qual esta edição é historicamente muito relevante. Após a pandemia e depois do governo Bolsonaro, vejo nos curadores internacionais um renovado interesse pelo Brasil. Diferentemente do passado recente, quando curadores “descobriram” o trabalho de nossos grandes artistas dos anos 1950, 1960 e 1970, agora o interesse é por artistas jovens, muitas vezes periféricos, cujos portfólios falam de questões atuais.
L’OFF Você e sua mulher, a Luiza, visitaram a Serra da Capivara no Piauí. Como foi esta viagem?
RK Há anos ouvindo falar sobre o Parque Nacional Serra da Capivara, no Piauí, no carnaval deste ano, embarcamos nesta aventura para admirar a arte rupestre. São quase 500 sítios arqueológicos com milhares de pinturas feitas 25 mil anos atrás! A cadeia montanhosa de Capivara foi densamente povoada na era pré-colombiana. A pesquisa da importante arqueóloga brasileira Niède Guidon, que dedicou os últimos 50 anos da sua vida à criação e preservação do parque, sugere que o Homo Sapiens chegou às Américas diretamente da África e não via Estreito de Bering.
L’OFF Agora onde estão os caldeirões da nova criatividade?
RK A cultura é criada em todas as partes, na periferia, na floresta, no cerrado, em qualquer lugar onde há um mínimo de liberdade para as pessoas se expressarem. Nos últimos anos, houve uma movimentação intensa em duas cidades portuárias europeias, mediterrâneas, ambas com grande confluência cultural – Marselha, na França, e Nápoles, na Itália. Mas, como falei, a cultura contemporânea está em ebulição em todos os cantos do planeta.