Moda

Estúdio Cena: o olhar em uma moda de outrora e os pés no hoje

Tratando o mundo como um palco, a Estúdio Cena aparece com o olhar em uma moda de outrora e os pés no hoje

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Looks da coleção Entreato, apresentada na última Casa de Criadores pela Estúdio Cena.

Tratando o mundo como um palco, a Estúdio Cena de Lucaz Roberto, aparece com o olhar em uma moda de outrora e os pés no hoje, apresentada na Casa de Criadores. Confira!

Nos movimentos cíclicos das gerações, há um movimento nascente de novos criadores brasileiros que não estão mais olhando para o streetwear moderno, voga dos últimos anos. Ajustando perspectivas, querem construir as suas doses de drama com base em técnicas e silhuetas dos grandes couturiers — e, a partir dali, rever esses ideais para o contemporâneo. É o caso da Estúdio Cena, de Lucaz Roberto, que fez o seu desfile de estreia na última Casa de Criadores, mas já tem rol pesado de clientes — de Linn da Quebrada, a primeira a usar, a Liniker, Letticia Muniz e Pedro Sampaio.

Na vida de Lucaz, o modão showstopper vem atrelado ao mundo da roupa feita sob medida, com tempo e provas, que ele quer provar ser democrática. “A ideia é mostrar como esse sob medida pode abranger todas as pessoas, com as peças feitas para seus próprios corpos. É muito mais sobre a costura e o artesanal do que uma roupa necessariamente cara”, conta, pontuando que suas referências vêm de um choque de realidades. “Essa imagem veio muito da minha mãe, que sempre foi uma mulher gorda e precisava fazer ou encomendar as suas roupas. E nos anos que passei trabalhando em uma grande varejista de moda, até outubro passado — ali, na prática do dia a dia, você percebe que as pessoas costumam se vestir com o que há disponível, não necessariamente o que querem ou que fica bom.”

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Look da coleção Entreato, apresentada na última Casa de Criadores pela Estúdio Cena de Lucaz Roberto.

Na contramão, os parâmetros da Estúdio Cena são bem analógicos. Do texto de Shakespeare que inspirou sua criação (O mundo é um palco) à paixão do criador pelo teatro, literatura e, claro, a alta-costura. “Ali podemos ter um vislumbre do mais próximo que a moda pode chegar da arte. Cristóbal Balenciaga é uma megarreferência minha em modelagem, Schiaparelli enquanto cores e desenhos. O que tenho tentado fazer, de alguma maneira, é sonhar com essa alta-costura e trazer para a realidade de um artista independente brasileiro”, diz. “A partir disso, escolher os melhores tecidos dentro das possibilidades, priorizar o acabamento. É um processo mais devagar. Gosto de criar essa experiência pessoal, com tempo, do ateliê.”

Inaugurada em 2019, logo depois da formatura pela FMU, a etiqueta de Lucaz ganhou estofo no último semestre — culminando no desfile que olhava para Virginia Woolf para apresentar os seus repertórios de plissados, volumes e amplitudes com sedas, chiffons e cetins. O resultado é bem dramático, sem dúvida; mas com um pé firme na vida real e uma boa dose de consciência social do século 21: a maior parte das personagens vestidas pela Estúdio Cena são mulheres, pessoas pretas e LGBTQIAPN+.

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Lucaz Roberto.

“Sabe, eu já faço uma moda que olha para um lugar muito branco e elizabetano, tinha a consciência de que precisava trazer isso para o agora, para o real. Não queria cair numa marca de mulheres brancas e loiras, essa imagem de rainha sem sentido. Por isso há esse esforço: as minhas referências já são tão antigas, é uma ferramenta que encontrei. Tenho uma verba de criação planejada mensalmente para projetos de pessoas pretas e trans, por exemplo”, conta. “São elas que levarão minha marca para onde eu quero. Se queremos mudar a cultura, precisamos mudar a imagem. Digo que a minha atuação como estilista é mais ser um curador de imagens do que um costureiro. Então, estou apenas fazendo o meu papel em viabilizar, o máximo que posso, a beleza.”

© MARCELO SOUBHIA 

@AGFOTOSITE

FOTOS: Diego Rodrigues.

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