Viagem

Jardim de histórias brasileiras em meio as férias

A Serra Fluminense é o refúgio perfeito para quem gosta de um verão de temperaturas mais amenas, ar puro, história nacional, arte e riqueza de uma fauna e fora extraordinárias

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Foto: Emir Pena

É curioso imaginar que uma cidade inteira foi concebida para “agradar” a uma pessoa. Mas essa é a história mais popular sobre a fundação de Petrópolis, grande polo turístico do estado do Rio de Janeiro.

A inóspita Serra Fluminense, por sua imensa altitude e densa mata fechada, começou a se tornar importante na história nacional por ser via de acesso da então capital à rota do ouro de Minas Gerais. Ela também encantou profundamente dom Pedro I, após um pernoite na fazenda de padre Correia. O local era um importante ponto de parada de tropeiros e expedicionários estrangeiros, como o inglês Robert Walsh, médico, capelão e autor do livro Notícias do Brasil: 1828-1829. A obra retrata o país desde o descobrimento até a passagem do viajante por áreas tropicais. É considerado um catálogo fidedigno daquele tempo.

O primeiro imperador do Brasil decidiu então adquirir uma propriedade próxima à fazenda do padre por dois motivos: criar um palácio em uma região de clima mais próximo ao europeu, e assim receber seus visitantes do Hemisfério Norte com mais conforto (já que eles estavam pouco acostumados com o calor carioca), e tratar sua filha. A princesa dona Paula Mariana, mais conhecida como Paula de Bragança, sempre teve uma saúde frágil, mas, na altitude, se sentia melhor. Com a abdicação e morte de dom Pedro I, ficou a cargo de seu filho herdar as terras e conduzir a construção do sonho de seu pai, do mordomo real Paulo Barbosa da Silva, cujo projeto era do engenheiro alemão Júlio Frederico Koeler.

O Palácio de Verão e essa espécie de vila ao redor, que usava o curso dos rios para ajudar a vida dos moradores e não como ponto de dejetos (algo muito comum na época), se transformou em um dos centros de veraneio mais agradáveis do país. Mais tarde, também ficou popular como destino de inverno, entre fondues e hospedagens de estilo alpino.

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Para quem pretende curtir a temporada mais quente do ano por lá, assim como a família imperial, saiba que o sol segue a pino, porém entre frescas brisas das montanhas. Ou seja, dá para curtir uma boa piscina pela manhã e uma taça de vinho ao lado de uma fogueira durante a noite.

O cenário histórico ainda é um chamariz e tanto para os que querem conhecer mais o desenvolvimento do país, com visitas obrigatórias pelo Museu Imperial, palácio em estilo neoclássico com acervo do período imperial brasileiro, como a coroa de Pedro II, Museu Casa Santos Dumont, Catedral São Pedro de Alcântara, Igreja Luterana e o imponente Palácio Quitandinha, hoje abrigando o Sesc Quitandinha. O prédio, um dos mais preservados da região, foi construído para ser o maior cassino-hotel da América do Sul.

Também é possível desfrutar a ótima gastronomia e as peças finas na vizinha Itaipava. O destaque fica para o Maria Maria, espaço com armazém, empório e objetos de decoração; o Horto Brejal, local de piqueniques; a Casa do Alemão, com croquetes e biscoitos com influência gastronômica alemã; e a Pão Pão, padaria com empadas para comer rezando.

Em arte, não deixe de visitar a tradicional Cerâmica Luiz Salvador. Fundada em 1952, com tradições da indústria ceramista de Alcobaça, Portugal, misturou no Brasil cores mais vivas e, com o passar dos anos, novas técnicas de pintura e desenvolvimento.

Serra dos Órgãos

A região é incrível também para os amantes de aventura. Ali encontra-se a famosa Serra dos Órgãos, um dos melhores locais do país para visitar cachoeiras e para a prática de esportes de montanha, como escalada, caminhada e rapel. São mais de 200 quilômetros de trilhas, para todos os tipos de visitantes. Aos mais bem treinados, travessia de três dias entre Petrópolis e Teresópolis ou escalada no Dedo de Deus, considerado o marco inicial da prática no país. Na região também encontra-se a Agulha do Diabo, uma das 15 melhores escaladas em rocha do mundo. Para quem quer começar de leve, o Poço Paraíso é cenário para banhos refrescantes e caminhada curta, de cerca de 20 minutos.

O Parque Nacional da Serra dos Órgãos, criado em 1939, abriga mais de 2.800 espécies de plantas, 462 espécies de aves e 105 mamíferos, além de uma rica diversidade de anfíbios e répteis, muitos deles ameaçados de extinção, e tantas espécies endêmicas.

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Casa Marambaia

Quem acha que hotéis não podem pautar uma viagem não conhece o potencial desses empreendimentos, principalmente em prédios históricos, de ser os protagonistas do destino. O Hotel Bel-Air, em Los Angeles, por exemplo, foi cenário da última sessão de fotos de Marilyn Monroe. O Hôtel de Paris, em Mônaco, era refúgio de Churchill e um dos locais favoritos de Grace Kelly. O Le Meurice, em Paris, foi palco do casamento de Picasso.

O Lotte New York Palace, locação de produções famosas, como Gossip Girl e Will & Grace. Mais próximo, temos o icônico Copacabana Palace, com seus bailes repletos de famosos e figuras da sociedade. Hospedar-se em um desses pedaços palpáveis da história ultrapassa bons atributos de cama, mesa e banho. E é por esse espírito que a Casa Marambaia, a 15 minutos do centro de Petrópolis, é tão sedutora

A fazenda de estilo bem colonial, porém com obras entregues em 1947, de propriedade inicial de Odete Monteiro, pode parecer uma ode ao luxo inatingível, mas não tem nada de careta ali. O casal Monteiro, que fazia parte da alta sociedade carioca na época, investiu o que tinha de melhor para seu conforto e deleite do olhar. A filha deles tinha um amigo que ajudaria, por exemplo, na execução do jardim do casarão. Só que ele era ninguém menos do que Roberto Burle Marx, arquiteto, desenhista, pintor, urbanista botânico, cenógrafo, entre tantos outros predicados.

Em 1950, o “paisagista do século 20” terminava sua obra que, por muitas vezes, foi atribuída por críticos como sendo sua melhor criação. No livro Roberto Burle Marx: Uma Fotobiografia, de Soraia Cals (1995), obra aninhada no corredor do hotel de poucos quartos, há a melhor explicação sobre aquele jardim monumental que acompanha os visitantes do despertar ao adormecer, já que todas as suítes possuem sacadinhas charmosas voltadas para ele: “O moço paulistano aclimatado no Rio, uma vocação para o trópico que se confirma com a escolha da moradia… chamado para criar jardins na cidade de Recife, é lendo Os Sertões de Euclides que inicia as pesquisas no cerrado que terminarão, associadas à introdução de plantas amazônicas, por resultar no primeiro paisagismo brasileiro a romper com o jardim de modelo europeu” (trecho do texto “Roberto Burle Marx – O Parceiro da Natureza”, por Lélia Coelho Frota).

Além da riqueza que une cultura, arte e vida, também há peças históricas na propriedade, como a escrivaninha de Olavo Bilac, mobiliário onde foi composto o hino à bandeira. É assim, com um turbilhão de informações históricas, que você percebe que está em um local com elementos apresentados em alguma aula de história ou visita a algum museu.

O ciclo de bem-estar se fecha ali com uma experiência gastronômica franco-brasileira impecável, com assinatura dos chefs franceses Roland Villard e David Mansaud. Villard já passou por restaurantes estrelados, como o Le Pré Catelan. Já o parisiense Mansaud trabalhou no Sofitel Le Parc e Plaza Athenée, em Paris, e no icônico Le Louis XV, em Mônaco, sob a supervisão do chef Alain Ducasse. Em 2016, Mansaud assumiu o cargo de chef executivo do Belmond Copacabana Palace. No dia a dia, quem está presente no restaurante, na parte operacional, é Bruna Mello, chef com estágio no Hotel Les Prés d’Eugénie, três-estrelas Michelin, comandado pelo chef Michel Guerard.

Os pratos são executados no melhor estilo comfort food, direto da horta, com os vegetais sendo as grandes estrelas do menu, muito mais do que as boas proteínas de origem animal servidas ali. E não esqueça de pedir, em alguma noite morna, para desfrutar uma sobremesa ao ar livre. A experiência é única.

HOSPEDAR-SE EM UM DESSES pedaços palpáveis da história ULTRAPASSA BONS ATRIBUTOS DE CAMA, MESA E BANHO.

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