Pyer Moss apresenta coleção de inverno na alta-costura
Quem esperava que Kerby Jean-Raymond se comportasse na sua estreia na semana de moda de alta-costura francesa, provavelmente está com os olhos arregalados.
O desfile da Pyer Moss, que aconteceu neste sábado depois de ter sido adiado por conta de uma tempestade na data original, fez história por vários motivos. Não só por ser o primeiro criador preto norte-americano a desfilar no restrito evento francês, abrindo mais as portas para um futuro menos eurocentrado e branco na alta-moda, mas por traçar uma linha de ironia muito fina em cima de todas as expectativas de quem queria ver apenas roupas para tapete vermelho.
O estilista ocupou os jardins da mansão da Madame C. J. Walker e abriu os trabalhos com discurso forte de Elaine Brown, ativista e ex-integrante dos Black Panthers. Na sequência, ao som de 22 Da General, mostrou a que veio com uma série de entradas que, à primeira vista, passeiam entre o camp e o surrealista. Mas o que Kerby Jean-Reymond montou, na verdade, foi uma grande parada em homenagem à comunidade de criadores pretos esquecidos pela história - a maior parte deles, pouco ou nada reconhecidos pelas suas invenções que permeiam a sociedade.
Sabia que o semáforo foi inventado por um preto? Pois está lá. O esfregão, pai do mop que virou hit da quarentena? Também. A manteiga de amendoim? Idem. Os bobs para cabelos etc, já deu pra entender. Kerby traz até a bandeira afroamericana, criada por David Hammons nos anos 1990. Todos ícones de um orgulho roubado e negado historicamente de uma comunidade que a Pyer Moss representou e trouxe junto no seu momento histórico dentro da indústria da moda - não à toa, Kerby disse que era um show de celebração familiar.
A família ali é grande. E a reflexão, que já era clara com o desfile cheio de símbolos, fica óbvia no look final: a costumeira noiva da alta-costura é substituída por um look-refrigerador (sim, que também foi idealizado por um negro) e a mensagem escrita por ímãs: “mas quem inventou o trauma preto?”.