Os deliciosos coquetéis de Chula Barmaid pelo Brasil
Com alma de atriz e mãos de alquimista, a bartender argentina faz do balcão seu palco e de cada coquetel uma cena interessante.
Conheci Chula Barmaid numa noite em São Paulo, no Atlântico 212, restaurante do empresário Victor Collor. Sentei no balcão, pedi um coquetel e, sem esperar, fui puxado por uma conversa divertida e espontânea, dessas que se tornam gostosas naturalmente. Havia algo de magnético em sua presença: uma energia alegre, uma escuta generosa, uma hospitalidade quase performática. Saí dali com a certeza de que aquele encontro ainda renderia bons brindes.
Poucas semanas depois, a convidei para participar do Organic Festival Trancoso, evento filantrópico que organizo há alguns anos no vilarejo baiano. Só então comecei a mergulhar mais a fundo em sua trajetória - e percebi que seu trabalho no universo da coquetelaria vai muito além da técnica ou da criatividade. Chula tem uma leitura sensível e autoral do que significa fazer um coquetel. Mais do que misturar ingredientes, ela traduz atmosferas, adapta receitas a contextos, e entende o bar como um lugar de afeto, expressão e encantamento.
Artista de formação, Chula cresceu nos palcos de Córdoba, na Argentina, antes de encontrar na coquetelaria sua verdadeira forma de expressão. Iniciou a carreira como bartender em Buenos Aires e, desde então, construiu um repertório que soma 16 anos de experiência e passagens por lugares tão distintos quanto Uruguai, Índia, Espanha e França. Em cada país, absorveu referências culturais e técnicas, e foi refinando uma abordagem única - teatral, intuitiva, provocadora.
No Brasil desde 2018, sua estreia foi marcante: comandou o Bar dos Arcos, instalado sob as fundações do Teatro Municipal de São Paulo, um cenário perfeito para seu talento híbrido. Depois, brilhou no Cineclube Cortina, onde seu trabalho lhe rendeu o título de bartender do ano pela revista Veja São Paulo Comer & Beber, em 2022. Hoje, Chula divide-se entre dois projetos autorais: o bar Mamatungu, no Equador, com foco em sustentabilidade, e a empresa de consultoria Soledad, através da qual assina cartas de coquetéis para casas renomadas brasileiras como Futuro Refeitório, Leila (de Tania Bulhões), Chou, Barracuda Hotel & Villas, e o próprio Atlântico 212.
Cada menu que cria carrega uma narrativa, um gesto de pertencimento, um senso de cena. Sua experiência com teatro continua presente, não apenas nos movimentos precisos ao preparar uma bebida, mas na maneira como concebe o ambiente, treina as equipes e transforma o balcão em um lugar de celebração compartilhada. Para Chula, o bar é um palco - e os coquetéis, protagonistas de uma história. Aqui, apresentamos alguns dos seus lugares e coquetéis favoritos pelo Brasil.
- Leila Restaurante, Quase um Bellini
O Leila é uma casa afetiva da artista Tânia Bulhões, dentro da sua loja conceito. O coquetel criado por Chula, chamado “Quase um Bellini”, parte da referência clássica italiana, mas ganha sotaque tropical: abacaxi e pêssego defumado, misturados a vinho branco e bolhas, num resultado fresco, frutado, mas com o toque inesperado do defumado - como um verão guardado em uma linda taça. “A ideia aqui foi criar algo que parecesse uma lembrança boa de fim de tarde. Um Bellini que pegou sol na praia e fumou um charuto de frutas”, brinca Chula.
@leilarestaurante
- Chou Restaurante, Torta de Maçã
No restaurante Chou, a cozinha é sempre protagonista, mas deixa um belo espaço para a coquetelaria. O drinque “Torta de Maçã” é puro aconchego líquido: pisco, infusão de torta de maçã, toque de canela e bolhas, com um perfume quase natalino. “A infusão é feita a partir de uma torta de verdade, que preparamos na cozinha do Chou. Depois, o pisco absorve essas camadas e a gente finaliza com espumante para trazer leveza”, explica Chula.
@restaurantechou
- Futuro Refeitório, Milkshake de Cookie com Whisky
Cafeteria, padaria, restaurante e também bar, o Futuro Refeitório é um verdadeiro laboratório de ideias. O drinque criado por Chula é puro hedonismo com técnica: milkshake de cookie de baunilha e chocolate com whisky irlandês. Sobremesa? Drinque? Os dois.
“Pensei no que a criança em mim gostaria de beber depois de um dia difícil, e no que o adulto em mim mereceria. A resposta foi: os dois juntos.”
@futurorefeitorio
- Oiti, Lembranças Vermelhas
O primeiro projeto de Chula no sul da Bahia nasceu entre o mar, o mato e o calor. No Oiti, bar e restaurante com cozinha de produto dos hotéis Barracuda em Itacaré, o drinque “Lembranças Vermelhas” equilibra Campari, cítricos frescos, aquafaba e raspas de limão. Uma espuma sedosa cobre o vermelho intenso, quase como uma saudade líquida. “Quis criar algo que evocava paixão, mas também frescor. É um drinque que tem fogo, mas também brisa.”
@oiti.restaurante
- Atlântico 212, Vermute
Foi no balcão do Atlântico 212 que conheci Chula. Lembro do sorriso generoso, da conversa animada e de um drinque que parecia traduzir o espírito da casa: mar, brasa e simplicidade precisa. O “Vermute” combina Ambrato, Angostura Orange, água com gás - e vem servido com tomate confit e boquerones. “É um coquetel que quer estar com a comida. Não quer brigar com ela. É salino, amargo e refrescante como um aperitivo à beira-mar.”
@atlantico212_
