Gastronomia

Um jantar memorável em Dubai

O recém-inaugurado restaurante FZN do chef sueco Björn Frantzén apresenta uma experiência imersiva que o coloca como um dos melhores fine dining da cidade.

indoors interior design elevator
A entrada do restaurante FZN em Dubai | Divulgação

Dubai é uma cidade onde tudo parece querer ser o maior, o mais caro, o mais vistoso. Mas há experiências que impactam justamente pelo oposto: pelo silêncio, pela precisão, pelo domínio absoluto do tempo e da técnica. Foi exatamente isso que vivi no FZN, restaurante recém-inaugurado no impressionante hotel Atlantis, The Palm, mas que já é, sem exagero, o melhor fine dining da cidade. Trata-se do novo projeto do chef sueco Björn Frantzén, um dos nomes mais respeitados da gastronomia contemporânea. Criador do restaurante triplamente estrelado Frantzén, em Estocolmo, e do Zén, em Singapura (também três estrelas), Frantzén é hoje sinônimo de uma culinária ultra-refinada que mescla a base técnica francesa, ingredientes e sabores nórdicos, e influências asiáticas.

O salão do primeiro andar do FZN | Divulgação

O FZN, seu primeiro restaurante de alta gastronomia no Oriente Médio, dá sequência a esse legado, ao mesmo tempo que apresenta uma nova camada de complexidade: o diálogo com os ingredientes e a cultura da região. A experiência no FZN não começa com um prato, mas com um gesto. O cliente é recebido em uma sala de estar elegante, onde canapés delicados são servidos como prelúdio. O ambiente lembra uma casa escandinava com toques japoneses: madeira clara, iluminação suave, arte sutil. Em seguida, um tour guiado apresenta os espaços, como se o cliente fosse um convidado pessoal do chef. Só então começa o jantar, servido na sala principal com a cozinha aberta acontecendo.

Lagostim sobre arroz koshihikari | Divulgação

O menu degustação é uma sequência poética e calculada. Há técnica, beleza e emoção em cada prato. E um detalhe faz toda a diferença: o serviço é feito pelos próprios cozinheiros. Quem executa o prato é quem o apresenta. Isso cria uma conexão direta com a criação e reforça o senso de ritual e cuidado. Cada etapa do jantar é um microcosmo de texturas e sabores. O taco de crustáceo com aipo-rábano e laranja é uma explosão cítrica e cremosa. O crudo de toro com nabo japonês, morango fermentado e óleo de café é, talvez, o prato mais ousado da noite, equilibrando dulçor, acidez, gordura e um toque tostado. A lagostim sobre arroz koshihikari com gengibre oferece conforto e densidade. O chawanmushi com caldo de carne defumado e caviar da casa é um abraço quente com final salino. Ainda vêm o monkfish com beurre blanc de açafrão, espinheiro-marítimo e ikura, a french toast com trufa, queijo e balsâmico envelhecido, e sobremesas como o marshmallow gelado de limão com coco e capim-limão, a tarte tatin com maçã, louro e chá, e os petit fours, incluindo madeleines de missô.



Taco de crustáceo | Divulgação

A carta de vinhos é monumental: são mais de 1.300 rótulos de 15 países, incluindo vinhos raros, pequenos produtores e estreias em Dubai. A opção não alcoólica é um espetáculo à parte: traz composições como melancia com manjericão tailandês e pimenta verde, pera oxidada com sobacha e chá dong ding, infusão de cogumelo porcini com uva-passa e manteiga dourada. Tudo pensado para ser tão complexo quanto o menu.

O ambiente do restaurante | Divulgação

O design do restaurante compartilha o mesmo DNA de suas casas irmãs em Estocolmo e Singapura: formas orgânicas, luz controlada, uma beleza quase meditativa. A playlist, com 300 músicas escolhidas pelo próprio Björn, cria uma atmosfera íntima, sofisticada e levemente melancólica. Björn Frantzén é um arquiteto de atmosferas. Ex-jogador de futebol, autodidata, ele abriu o Frantzén em 2008 e logo conquistou sua primeira estrela Michelin. Em 2020, abriu a brasserie Astoria em Estocolmo. Neste ano, inaugura também a Brasserie Astoria em Marbella. Seu império cresce com consistência, sem perder a essência.

O chef Björn Frantzen | Divulgação

"Dubai evoluiu rapidamente como um polo gastronômico global. A energia criativa daqui me lembra da explosão da cena nórdica há 15 anos, uma época de inovação, criatividade e gastronomia que rompia fronteiras", me contou Frantzén. "Vi a mesma energia e enxerguei a oportunidade de fazer parte desse crescimento vibrante." O chef, que visita Dubai há mais de uma década com a família, diz que esse era o momento certo para trazer algo realmente especial para a cidade. E reforça: "Há muita coisa acontecendo em toda a região. É um momento emocionante."

A entrada do restaurante | Divulgação

Ao perguntar como o FZN se diferencia do restaurante original em Estocolmo, ele responde: "É como receber o cliente em casa—começa com canapés, segue com um tour, depois o jantar na sala de refeições e drinks no terraço, com vista para o skyline de Dubai." Segundo Frantzén, o menu está em transformação. "Quando abrimos em Singapura, a comida era mais europeia. Mas com o tempo, trabalhando com fornecedores locais, passou a ter alma asiática. Vejo um caminho semelhante aqui. Aos poucos, vamos incorporar mais influências do Oriente Médio."

O ambiente do restaurante | Divulgação

Sobre os desafios de adaptar seu conceito a Dubai, ele destaca o público internacional da cidade: "Foi difícil equilibrar o DNA do Frantzén com as expectativas de uma clientela tão diversa." Outro obstáculo foi encontrar ingredientes locais que atendessem aos altos padrões do grupo. "Levou tempo até identificarmos os fornecedores ideais. Mas Dubai tem uma produção local excelente, e vejo isso evoluindo a cada dia." Importar ingredientes nórdicos ainda é um processo complexo, segundo ele. "Envolve regulamentações rigorosas, custos altos e logística específica. Mas vale a pena: são ingredientes essenciais para nossa cozinha. Com o tempo, firmamos parcerias com fornecedores confiáveis."

Tarte Tatin | Divulgação

Dubai tem muitos restaurantes caros. Mas poucos verdadeiramente memoráveis. O FZN é um divisor de águas: não é apenas um dos melhores fine dining da cidade, é um dos mais promissores do mundo. Sua combinação de técnica, precisão, beleza e alma o coloca em outro patamar. É uma casa feita para vencer prêmios, sim, mas, mais que isso, feita para deixar uma marca. Ao sair do FZN, tive a nítida sensação de ter vivido algo raro. Um jantar que começa com um gesto e termina com uma memória gravada na pele.

Tags

Posts recomendados