Moda

Fotógrafo Martin Parr tem seu trabalho celebrado em um novo livro

Fotógrafo Martin Parr, que abrange tanto o mundo da moda como a “vida real” na Grã-Bretanha, é celebrado em um novo livro que reúne três décadas de trabalho

Delicatessen Katz’s, Nova York, 2018
Delicatessen Katz’s, Nova York, 2018

O trabalho inflexível do fotógrafo Martin Parr, que abrange tanto o mundo da moda como a “vida real” na Grã-Bretanha, é celebrado em um novo livro que reúne três décadas de trabalho. Confira!

Por mais de meio século, as inabaláveis imagens do celebrado fotógrafo documental Martin Parr, que retratam as festas de lingerie da era Thatcher, os frequentadores da Praia de Brighton relaxando próximo a pilhas de lixo e os shoppings cafonas de Manchester, narraram os absurdos da cultura consumista da Grã-Bretanha, com muito humor e um olhar idiossincrático.

Martin Parr
Looks de passarela em um museu de arte para revista de moda, Nova York, EUA, 2019 - Foto: Divulgação.

Agora, um novo livro oferece uma perspectiva peculiar dos próprios instintos comerciais de Parr. Fashion Faux Parr, que sai pela editora Phaidon, é a primeira retrospectiva dedicada à obra fashion de Parr, abrangendo três décadas de cliques para revistas e parcerias com marcas como Gucci, Balenciaga e Stüssy. 

Há muitas maneiras de interpretar o trocadilho do título do livro – algo como “o falso Parr da moda”. Seria a fotografia de moda um bico para o “falso Parr”, em oposição às premiadas imagens, em estilo documental, do Parr “real”? Ou será que suas fotos ácidas e sarcásticas – modelos no banheiro; colares da Urban Outfitters espalhados por cima de dentaduras em uma barraca de um souk de Marrakech; enrugados banhistas franceses vestidos com Gucci – são vistas como uma mancada nesse mundo cheio de deslumbre e faz de conta que é o da moda? Talvez o título se refira à escolha de Parr de incluir tropeços profissionais, como uma campanha de 2023 da Balenciaga que foi descartada ou um portfólio de designers emergentes de Londres que ele fotografou “para uma pequena revista que não me pagou pelo trabalho”, observa a introdução, “e por isso as fotos nunca viram a luz do dia”.

Vivienne Westwood
Vivienne Westwood, Londres, 2012 - Foto: Divulgação.

“Fique à vontade para encarar isso como quiser, de verdade ", diz Parr, um sorriso irônico marcando seu rosto. Mas não acredite muito nisso. “A moda é só uma extensão do meu próprio trabalho. Uso o mesmo estilo e as mesmas técnicas. É por isso que, quando você folheia o livro, sabe que são fotos minhas, porque, espero, esse estilo, essa linguagem e essa paleta são inconfundíveis.” A “única diferença”, ele observa, “é que eu geralmente preparo as coisas para fotografar, enquanto, no meu trabalho particular, simplesmente capturo as coisas como elas realmente são por aí”.

Martin Parr
Uma publicação de Fashion Faux Parr que mostra fotos de bastidores de semanas de moda no fim dos anos 1990 e início dos 2000 - Foto: Divulgação.

As 250 fotografias do livro misturam o mundano com o magnífico, oferecendo uma visão seriamente nada séria da diáspora da moda. Lá estão retratos da dama Vivienne Westwood, em pé, num banheiro público sujo, usando meia-calça transparente e uma camiseta com os dizeres “Revolução climática”; a modelo Stella Tennant colhendo flores em Dunbar, na Escócia; e o estilista Paul Smith sentado em sua escrivaninha bagunçada em Londres, cercado de pilhas de livros, pedaços de pano, brinquedos e bugigangas. Instantâneos imprensados entre ensaios de moda em supermercados e fotos de modelos que fazem caretas para a câmera em um posto de gasolina em Arles, na França. “Existe uma malandragem aí – acho que é a melhor palavra para descrever – que talvez seja tão subversiva como passar por uma cirurgia dentária”, declarou Parr. Ele se referia a um dos destaques do livro: uma foto de 2004 que foi feita no consultório de um dentista alemão durante uma sessão de limpeza dos dentes de um jovem paciente. “O aspecto surreal pode de fato transformar uma foto em um quadro para o qual é preciso olhar duas vezes para perceber o que está acontecendo”, diz.

Martin Parr
Uma campanha recente da Gucci incluída em Fashion Faux Parr - Foto: Divulgação.

Uma abordagem crua e ousada da fotografia, talvez inesperadamente, fez de Parr – um comendador da Ordem do Império Britânico de 71 anos – um queridinho do design. Para uma revista impressa em jornal que promovia a coleção primavera-verão masculina de 2016 de Henry Holland, Parr fotografou um lenço com a inscrição "Martin Fucking Parr" dentro de uma sorveteria na cidade de Ramsbottom, na Grande Manchester. “É um lenço muito raro, na verdade. As pessoas me perguntam sobre ele o tempo todo”, conta. “Não sei quantos deles foram fabricados, mas parece que se esgotaram bem rápido. Tenho um no nosso arquivo.”

No ano passado, ele fotografou o extravagante desfile de Simon Porte Jacquemus à beira-mar, em Versalhes, que resultou em um livro publicado pela marca, de edição limitada, com imagens dos convidados entrando em barcos brancos a remo no Grande Canal do parque. Quando Parr e Jacquemus fizeram uma noite de autógrafos do livro na principal loja do estilista, na Avenida Montaigne, em Paris, Parr foi tratado como um rock star da moda. “Nós autografamos e fizemos dedicatórias de 500 livros em três horas e vinte minutos”, conta. O fotógrafo é tão adorado pela intelligentsia da moda que, na real, seu nome se tornou gíria. Quando era diretor criativo da Gucci, Alessandro Michele certa vez intitulou uma sessão de fotos para a campanha de um relógio de “Tempo de Parr”.

“EXISTE UMA malandragem AÍ – ACHO QUE É A MELHOR palavra PARA descrever.”

Assim como o trabalho do também venerado fotógrafo de moda Juergen Teller, o “realismo sujo” das imagens de Parr ajudou a pavimentar o caminho para as lentes incautas de muitos dos documentaristas de moda de hoje, entre eles Jack Davison, Harley Weir e Sam Youkilis. “Moda é resolver um problema: como fazer uma foto interessante com um certo acessório ou peça de roupa?”, diz Parr. “E nós, fotógrafos documentais, fotografamos com ideias. E aí as pessoas querem usar essas ideias que tivemos e aplicá-las nas questões de moda.”

Martin Parr
Backstage no desfile de Jacquemus em Versalhes, 2023; Paul Smith, Londres, Reino Unido, 2016 - Foto: Divulgação.

Uma das primeiras incursões de Parr no mundo da moda foi em 1999, em Rimini, a cidade natal de Fellini – na costa nordeste da Itália – em uma sessão de fotos que deveria ter os clubes noturnos à beira-mar de um resort e a água rasa do local como pano de fundo. Em vez disso, Parr fotografou modelos em vestidos de lantejoulas na praia enquanto homens sarados em sungas faziam flexões e idosas com chapéus de praia entravam na cena. Esse editorial parecia uma extensão das fotos espontâneas de Parr, que muitas vezes revelam como o estilo imprime identidade nos britânicos da vida real – seja num espetáculo de seda e brocados de um casamento sikh, seja nas foliãs seminuas de uma despedida de solteira, seja em peixeiras com lenços xadrez no estilo da Burberry na cabeça. Love Cubes, uma série de 1972 que documenta casais que compartilham seu gosto por roupas, funciona como uma máquina do tempo de uma era passada: mulheres com estilo à la Farrah Fawcett com calças flare de bolinhas, homens com costeletas espessas em ternos de três peças.

“Acho que a diferença entre o que as pessoas estão usando é muito mais evidente no meu trabalho documental do que nas minhas fotos de moda”, reflete Parr. “Eu mantenho a real.

Martin Parr
Os direitos autorais de todas as fotografias são de Martin Parr/Magnum Photos, e as imagens são cortesia da editora Phaidon - Foto: Divulgação.

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