Ana de Armas conta como foi atuar em seu papel mais desafiador
Blonde ambition! Depois de conquistar Hollywood, a atriz cubana Ana de Armas assumiu seu mais desafiador papel até o momento: a inimitável Marilyn Monroe
Los Angeles. Dia dos Namorados, 2018. Uma sósia de Marilyn Monroe passeia de carro por Hollywood. Poderia ser uma imitadora de celebridades a caminho de entregar pessoalmente um embaraçoso cartão? Talvez. O palpite menos óbvio seria Ana de Armas, com uma barata peruca platinada, indo em direção à sua primeira audição para o papel principal em Blonde, do diretor Andrew Dominik. Uma amiga maquiadora havia ajudado Ana Armas a se caracterizar. “Fizemos a maquiagem o mais próximo possível do que achávamos que deveria ser”, recorda-se ela com uma risada. “Claro que estava muito longe do que foi [eventualmente] criado para o filme. Mas ajudou, eu acho.”
Há uma década Dominik vinha tentando fazer Blonde, baseado no romance histórico homônimo de Joyce Carol Oates (em diferentes estágios, Jessica Chastain e Naomi Watts foram convidadas a participar do projeto). Quando Armas completou sua audição — a cena do encontro no trailer em que contracena com Bobby Canavale, cuja caracterização foi construída de acordo com o ex-marido de Monroe, Joe DiMaggio — Dominik soube que havia encontrado sua Marilyn. Brad Pitt também. Sua produtora, Plan B, produziu o filme da Netflix, que estreará no serviço de streaming em 23 de setembro. “[Blonde] levou dez anos para ser feito”, afirmou Pitt recentemente em uma entrevista para o Entertainment Tonight. “Foi só quando encontramos Ana que conseguimos cruzar a linha de chegada.”
Nada mau para o primeiro papel principal de Ana. A atriz, 34, cresceu em Cuba e estudou artes cênicas na Escola Nacional de Teatro de Havana por quatro anos, antes de se mudar para a Espanha e estrelar vários filmes e programas de TV. Mudou-se para Los Angeles em 2014, depois de fazer o papel de Felicidad Inglesas, a esposa do famoso boxeador panamenho Roberto Durán, na cinebiografia Punhos de Aço, ao lado de Edgar Ramirez e Robert De Niro. Falante nativa de espanhol, de Armas conseguiu papéis em filmes de diretores de prestígio, como Todd Phillips (Cães de Guerra, 2016) e Denis Villeneuve (Blade Runner 2049, 2017), enquanto mergulhava nas aulas de inglês. Meros quatro anos depois de chegar em Tinseltown, foi escolhida para representar um dos ícones mais reconhecidos da história americana. “Eu não cresci familiarizada com Marilyn ou os filmes dela”, admite. “Estou orgulhosa por ter a confiança de Andrew e a chance de justificá-la. Acho que qualquer atriz, seja cubana ou americana, sentiria a pressão.”
Um ano e meio se passaria entre o dia em que Ana assegurou o papel de Marilyn Monroe e o momento em que ela de fato pisou no set de filmagem de Blonde. Durante esse tempo, a atriz trabalhou com um treinador de dialetos e pesquisou o ícone exaustivamente. Por fim, decidiu: “Meu trabalho não era imitá-la. Eu estava interessada nos sentimentos dela, em sua jornada, em suas inseguranças, e em sua voz, no sentido de que ela, verdadeiramente, não teve uma.”
O filme é consistente, como o bem recebido romance de Oates – uma versão fictícia da vida de Monroe baseada nas duras verdades de sua existência. Nascida Norma Jeane Mortenson, filha da mãe solteira Gladys Pearl Baker, uma atriz com problemas mentais e de saúde acrescidos por vícios não tratados — angustiante e brilhantemente interpretada por Julianne Nicholson no filme —, Blonde segue Monroe desde os cuidados intensos com a mãe até sua vida como órfã, pin-up e eventualmente um ícone da indústria cinematográfica. Norma Jeane compartilha o amor da mãe pelos filmes e o escapismo que eles proporcionam, e Marilyn Monroe torna-se seu mítico alter ego. Em quase todas as fases da vida de Monroe, as pessoas que supostamente deveriam cuidar dela acabaram por corrompê-la. Mostrando Monroe em sua totalidade — ambiciosa, determinada e exuberante, mas também marcada por estupro, abuso e uma desenfreada misoginia — Dominik e Ana entregam uma perspectiva mais ampla de tudo o que Monroe suportou, desembocando em sua trágica morte por overdose de barbitúricos. Em uma cena particularmente pungente de Blonde, a Monroe de Ana grita histericamente durante os exercícios rotineiros em uma aula de atuação. Posteriormente indagada pela professora sobre o que ela estava pensando naquele momento, Monroe responde, “Eu não estava pensando... talvez eu estivesse me lembrando?”
A atuação de Ana como a humilde zeladora Marta Cabrera no filme de suspense de 2019 de Rian Johnson, Entre Facas e Segredos, garantiu a indicação ao Globo de Ouro como melhor atriz. E, com isso, o portal de Hollywood se abriu. Paparazzi fotografavam-na no set de Blonde, inteiramente vestida de Marilyn. Ana mostrou suas proezas como uma estrela de filmes de ação no papel de Paloma, uma sexy agente da CIA posicionada em Cuba no carro de James Bond em 007 – Sem Tempo para Morrer. Para as estreias mundiais de Agente Oculto — um filme com o qual a Netflix teria contribuído com 200 milhões de dólares na esperança de torná-lo uma franquia de longa data, assim como a de Bond — foi vestida com exclusividade pela Louis Vuitton e é uma embaixadora da marca. Ela também é Embaixadora Global da marca Estée Lauder e o rosto do National Diamond Council. Ao todo, trabalhou em seis filmes nos últimos três anos, e isso durante uma pandemia.
A vida pessoal de Ana também rendeu manchetes. Depois de filmar Águas Profundas, ela namorou publicamente seu parceiro de elenco, o ator, diretor e ganhador do Oscar Ben Affleck. O relacionamento foi assunto fácil para os tabloides. Em uma recente entrevista para a Elle, a atriz admitiu que esse tipo de escrutínio foi um dos motivos para querer deixar Los Angeles (ela e Affleck romperam em janeiro de 2021; Ana agora namora o executivo do Tinder Paul Boukadakis e mora em Nova York).
“Algo dessa entrevista será [tirada de contexto] e se tornará uma outra coisa,” diz ela. “É aterrorizante, porque não há nada que você possa realmente fazer. É por isso que ter família e pessoas que a amam é tão importante. E [Marilyn] não tinha. Quando você pensa a respeito disso, é fácil compreender como pode se destruir. As pessoas podem ser muito arrogantes ao comentar sobre a vida ou o corpo de alguém, ou sobre sua sexualidade ou relacionamentos. Isso pode realmente causar danos.”
A classificação indicativa de 17 anos para Blonde, a primeira da Netflix, tornou-se uma sensação na imprensa por si só. A hipersexualizada persona de Monroe — como um reflexo de seus próprios desejos, ou como as pessoas se aproveitaram dela — é o que Dominik escolheu encarar. Ana concorda. “Eu não entendi por que isso aconteceu,” diz ela, a respeito da classificação. “Eu posso dizer vários programas ou filmes que são muito mais explícitos, com muito mais conteúdo sexual do que Blonde. Mas para contar essa história é importante mostrar todos os momentos da vida de Marilyn que a fizeram terminar do jeito que terminou. Precisava ser explicado. Todos [no elenco] sabíamos que teríamos que ir para lugares desconfortáveis. Eu não era a única.”
Juntamente com Nicholson como Gladys e Cannavale como o ex-atleta, Adrien Brody também estrela Blonde como o dramaturgo (construído segundo o terceiro marido de Monroe, Arthur Miller). “Não consigo expressar o quanto amo aquele homem,” diz ela sobre Brody. Os dois fizeram algumas cenas sensuais juntos, mas entre as tomadas se divertiam um com o outro. “Ana transmite muita força, mas ainda traz uma fragilidade vulnerável e uma sensualidade poderosa que soam íntimas e impregnadas de verdade,” diz Brody. “Ela tem um espírito incrível e senso de humor. Nós ríamos muito juntos no set, mas ambos temos um saudável respeito pelo processo criativo.”
A atriz reencontrou-se com Brody e Chris Evans — pela terceira vez — no ainda inédito Ghosted, do qual ela é também produtora executiva pela primeira vez. Como relatado em Blonde, Monroe deixou seu contrato de estúdio e começou sua própria produtora. Ela também defendia a igualdade salarial. Essas precoces ações feministas eram praticamente desconhecidas na época por Hollywood, e demonstram o quanto Monroe era muito mais astuta do que as pessoas acreditavam. Ana ressalta que Monroe queria ser levada a sério. “Ela queria ter o controle do material com o qual iria trabalhar. Ninguém pensava sobre isso [naquela época].” Ana ecoa um sentimento parecido quando fala de sua própria carreira. “Nem tudo são filmes de super-heróis ou de ação,” ela diz. “Fico feliz por fazer parte deles, mas há outras coisas pelas quais anseio, e são outros filmes com diretores como Andrew.”
Com nossa entrevista chegando ao fim, pergunto a ela sobre a importância da tatuagem de lua crescente em seu braço direito. Estou na expectativa de ouvir sua resposta com alguma informação de significado espiritual, sobre como luas crescentes representam nossas intenções e desejos. É quase um alívio quando ela admite que a tatuagem está mais para uma tolice. “Eu amo a lua e o número três é o meu número da sorte, então fui no tatuador e disse, ‘Faça a lua no terceiro dia da fase.’ Era tão fina que parecia um arranhão, então eu disse ‘Quer saber? Esqueça. Faça só mais grossa.’”
Créditos:
Fotos: Thomas Whiteside
Produção Samantha McMillen
Cabelo: Jenny Cho
Make Up: Melanie Inglessis
Manicure: Yoko Sakakura
Cenografia: James Lear
Tecnologia Digital: Mike B
Produção: Ilona Klaver
Assistentes de Fotografia: Reto Sterchi, Steve Yang e Jacob Messex
Assistente de Stylist: Madeleine Kennedy
Assistente de Adereços: Currie Ritchie