Buenos Aires: um roteiro surpreendentemente saboroso

Fui e voltei de um fim de semana prolongado em Buenos Aires, mais uma vez, com uma sensação deliciosa. Em poucas horas de voo partindo de São Paulo, a capital Argentina me transporta para o prazer de andar na rua, flanar e comer bem. Um dos meus melhores amigos na cidade, Picky Courtois, costuma guiar meus compromissos gastronômicos. Há uma dificuldade recorrente entre nós: passar longe da vontade de repetir meus favoritos para descobrir os novos.

A cidade ferve de novidades mas é preciso, como em qualquer lugar do mundo, conhecer o caminho. Dessa vez iniciei minha jornada no Olí, em Palermo, com um ótimo café da manhã. A proprietária Olívia Saal é uma figura simpática que dá o tom. Provei o croissant prensado com queijo e presunto, um café expresso bem tirado e uma granola cheia de amor. O movimento agitado lembra os cafés europeus, adorei as mesas na calçada onde fiquei por horas. Depois de uma longa caminhada, parei no Café Mishiguene. A lista de pratos da cozinha judaica assinada pelo chef Thomas Kalika suscita uma máxima vontade. O almoço virou um verdadeiro banquete. Depois de experimentar os pães assados no forno com as pastas tradicionais, eu provei praticamente tudo, sem nenhuma vontade de resistir. Logo anoiteceu e fui caminhando até o Floreria Atlantico. Ao passar pela porta da floricultura e descer a escada que leva até um dos melhores balcões do mundo, reencontrei a equipe do mestre Renato Giovannoni. Provei seus coquetéis em lata e mais um tanto. Minha reserva no Don Julio estava marcada para às 21 horas, ainda tinha tempo para pedir as comidas do bar. Finalmente, rumo à melhor parrilla do mundo. A casa de Pablo Rivero não cansa de ganhar prêmios e clamar por sua liderança. Nessa esquina cheia de gente esperando por ele, Don Julio é de primeiríssima em todos os aspectos. O serviço é preciso e milimetricamente pensado. As melhores carnes, vegetais e vinhos do país estão aqui. Dito e provado isso, decidi ficar sem café da manhã no dia seguinte. Um hábito que tem me salvado ultimamente.

Hoje, o primeiro compromisso do dia será no El Preferido. Vou e volto quantas vezes for preciso, assumidamente é um dos meus restaurantes favoritos no planeta. Sei explicar o porquê. Eu me sinto bem nessa charmosa esquina de Palermo, há uma arquitetura que me acolhe e pratos que amo. Tudo me lembra um pouco Barcelona. Costumo começar com as charcutarias, pedir um filé à milanesa e terminar com os sorvetes. Mais tarde, marcamos de tomar drinques antes de conferir uma novidade. Destino um canto exclusivo de bom gosto, Casa Cavia. Ao encostar no bar tive a agradável surpresa de encontrar Flavia Arroyo. Provei algumas de suas criações, uma melhor do que a outra. Nessa altura quem já estava esperando por nós era o chef Tomás Treschanski. Partimos para o Tresha, um restaurante concebido nas estrelas. O jovem talento pensou ao extremo nas possibilidades do fine dining e propôs um menu experimental e autoral. Tudo busca impressionar do começo ao fim.

Como o tempo passa rápido, amanhã já será meu último dia. Voltar será preciso, e já saio daqui marcando uma nova passagem. Ainda bem, deu tempo de visitar a chef Narda Lopes no Comedor para um brunch dos Deuses. Essa mulher é inexplicável, ela consegue nos abraçar com sua comida. Do café da manhã até ao jantar, o lugar respira e exala informalidade. Entre tostadas, ovos, saladas, tempuras e empanadas, os pratos vão de ossobuco a bibimbap. Vá de mousse de chocolate ou de pavlova, ou absurdamente peça uma sobremesa de cada como eu. A comida é servida do jeito mais descontraído possível, para compartilhar, ou não. Fechei com chave de ouro, o restaurante Julia. Quase unanimidade na esfera dos profissionais da gastronomia, o chef e proprietário Julio Martín Baez imprime um estilo feliz em um minúsculo e aconchegante salão. Eu me diverti com uma equipe jovem que brinca de servir pequenos pratos com sabores explosivos. É muito difícil conseguir uma reserva, e vale qualquer espera ou retorno.