Tommy Hilfiger: um clássico nova-iorquino, all american e atemporal
Como bom americano, o estilista Tommy Hilfiger é também a essência de sua marca: all american, clássico e atemporal
Mesmo que Nova York seja um lugar onde sempre há novidades, no fundo é uma cidade de clássicos atemporais. Dos museus aos mais inusitados bares, locais cheios de histórias que sobrevivem ao teste do tempo, os quais todo visitante deve conhecer e que todo morador aprecia ter por perto. Uma cidade com tanta mistura de culturas e estilos de vida compõe uma tapeçaria complexa de personagens singulares. Você pode encontrar Lady Gaga aleatoriamente em uma baladinha em Downtown, assistir Woody Allen tocando jazz no Uptown ou pode até se deparar com Tommy Hilfiger em algum restaurante típico de Chinatown.
É difícil imaginar que o bairro chinês seria um dos locais favoritos do icônico designer. Residente na cidade desde os 18 anos, foi o amor pela culinária autêntica que o levou a explorar os mais desconhecidos restaurantes da região considerada uma das mais caóticas da cidade. Na verdade, isso só é um exemplo de que há poucas pessoas mais new-yorkers do que Tommy, que já morou no Soho, no Lower East Side e depois por muitos anos no The Plaza, o clássico hotel que virou residência, próximo ao Central Park.
A sua conexão com a cidade foi o que inspirou sua nova coleção apresentada durante a Semana de Moda em NY no dia 9 de fevereiro. “Momento Nova-iorquino”, como foi chamado o desfile, buscou fazer uma releitura dos clássicos da marca. Assim como a temporariedade das peças exibidas, o local escolhido a dedo para o desfile foi o tradicional restaurante Oyster Bar, dentro da Grand Central.
“Não existe outra cidade como Nova York. A energia que se sente aqui é incomparável. A arquitetura é diversificada. Sem dúvida, o trânsito é uma loucura, mas os restaurantes são fantásticos. E cada bairro tem a sua própria personalidade. Você pode ir ao Harlem e ver algo totalmente diferente do que veria no Brooklyn, Queens, Upper East Side ou Upper West Side. Cada área é única. E se você gosta de observar as pessoas, nunca vai se entediar”, aponta o designer durante a nossa entrevista exclusiva no seu showroom na Madison Avenue, a poucas horas do desfile. Simpático e informal, Tommy abriu a porta da sala esboçando um grande sorriso e se dirigiu para um sofá que combinava com o look monocromático em azul-marinho que ele vestia. O jeans e o blusão de gola rolê foram finalizados com um sneaker branco e o boné do New York Yankees – nada mais all american e Tommy Hilfiger do que isso.
A marca, que estourou nos anos 1990, foi reconhecida principalmente por popularizar o look preppy, remetendo ao visual de Varsity Jackets e sobreposições com jeans que são ainda tão presentes nos filmes e séries que passam nas escolas e universidades americanas. No entanto, ainda mais forte que a identidade de estilo, desde a sua fundação em 1985, a marca sempre levou em sua essência os conceitos de democratização e inclusão. “Sempre soube que a diversidade estaria no nosso DNA. Abri minha primeira loja aos 18 anos, no varejo. Tinha funcionários diversos, atendendo clientes diversos. Ali entendi que precisávamos ser multiculturais em tudo que fazemos e abraçar essa pluralidade ", lembra Tommy que na época ninguém estava criando roupas para pessoas de tamanhos diferentes.
Por muitos anos, essa filosofia não era tão bem vista por todos da indústria da moda, o que o tornou um nome um tanto controverso e foram algumas as tentativas a fim de arruinar a sua reputação. Hoje, celebrando quase quatro décadas da marca própria, isso pouco lhe incomoda. “É engraçado, porque nos anos 1990, fui muito criticado por abraçar o mundo do hip hop e vestir rappers. Diziam: por que está fazendo isso? Eles não vão deixar suas roupas bonitas. Ignorei tudo”, reflete com a satisfação de ter dado o passo na direção certa.
De fato, isso já é parte do novo normal da moda e há novas áreas dentro de empresas dedicadas a o que Tommy vê como uma boa evolução da indústria. Mesmo porque, para ele, nunca faz sentido a ideia de trabalhar apenas com um tipo de corpo. Recentemente começou a desenvolver linhas focadas para PCD, pois percebeu que havia uma grande necessidade para este público e pouquíssima oferta de produtos no mercado. Além do óbvio ganho comercial, ele destaca que sua ambição é “ser inclusivo e até liderar o caminho, de certa forma, para que outros possam ver o que estamos fazendo e queiram fazer o mesmo”, reflete.
Mas não é apenas na questão de modelagem ou até de público-alvo que o Tommy é inovador. Ao trabalhar com uma marca que atrai tanto o público jovem, ele é o que podemos chamar de um early adopter quando se trata de novas tecnologias ou estratégias para o seu negócio. “Lembro quando as pessoas falavam que ninguém compraria moda pela internet. Muitos se recusavam a entrar, achando que os computadores eram para empresas de seguros ou coisas do tipo”, ri, “e hoje estamos carregando minicomputadores nas nossas mãos o tempo todo.”
Assim como foi aberto ao que o online tinha para oferecer, lida da mesma forma com a inevitável chegada da temida inteligência artificial. “Prefiro acolher e entender a rejeitar, até porque gosto de ferramentas sofisticadas.” Ele comenta que se hoje fosse dar conselhos a alguém em início de carreira, seria para aprender ao máximo o que puder da nova ferramenta, pois ele acredita que irá acelerar todos os processos de design, fabricação e até no setor de marketing e publicidade, mas não substituirá a verdadeira criatividade. “Acho que nem descobrimos todo o potencial que ela traz ainda, mas está chegando e com força. E temos de lidar com isso”, conclui.
“ESTOU SEMPRE absorvendo TUDO À MINHA VOLTA. Não olho PARA ISSO COMO TRABALHO, É ALGO QUE faço NATURALMENTE. SIMPLESMENTE ACONTECE.”
Tommy Hilfiger
Tommy acredita que toda a tecnologia pode ser benéfica se soubermos usá-la a nosso favor e, sem dúvida, foram as inovações em comunicação que contribuíram para essa maior diversidade na moda que ele tanto almejava. As redes sociais deram espaço aos influenciadores de todos os tipos de corpos, etnias e idades e eles se tornaram os verdadeiros fazedores de opiniões. “Hoje não precisamos só falar com as celebridades de Hollywood.” Outro ponto que mudou muito o mercado da moda em sua visão é o fato de tudo ser fotografado e filmado o tempo todo, tornando até mesmo as atividades mais rotineiras um momento fashion, levando a moda como uma pauta popular.
“É um casamento. Uma grande junção com a arte, música, entretenimento, esportes. Tudo está conectado com a moda. E era de esperar, porque sempre soubemos que os atletas amam moda, os músicos também. E o mundo fashion ama música e esportes. Assim como o mundo do entretenimento e o da arte que sempre andaram juntos”, explica.
Esse boom de informações impacta também a sua inspiração, que vem dos mais variados lugares, seja de filmes e viagens, o que as pessoas vestem em aeroportos ou até literalmente durante a nossa entrevista – em que ele se apaixonou pelo casaco que eu estava usando e chegou a tirar uma foto para referência. “Estou sempre absorvendo tudo à minha volta. Não olho para isso como trabalho, é algo que faço naturalmente. Simplesmente acontece, nunca teve um processo de verdade.
E claro, este olhar plural se dá muito por residir em Nova York. “Ela é uma cidade diversa com D maiúsculo. Um verdadeiro caldeirão cultural.” Hoje ele é assumidamente um fã do tradicional Upper East Side, considera o bairro o melhor lugar para se morar. Habitué do Cipriani e apaixonado pelo Central Park, também gosta de passear pelas ruas de Downtown nas horas vagas. «Amo as ruas, os restaurantes e o ambiente do Soho onde passei grande parte da minha vida. No Lower East Side, onde morei por pouco tempo, até hoje gosto das lojas vintage e dos pequenos restaurantes e cafés de lá. Poderia passar horas explorando.”
No entanto, mesmo sendo um eterno nova-iorquino, a necessidade de ter uma folga do ritmo frenético da cidade aparece. Entre suas atividades favoritas estão passear de iate ou assistir a documentários nos serviços de streaming por horas a fio. Mas todo criativo tem os seus guilty pleasures e ele admite que se diverte muito assistindo a série de reality The Real Housewives com a sua esposa. No fim das contas, o que mais gosta é o que muitos outros no país costumam fazer: acompanhar os esportes e as notícias. Como todo bom americano.