Outubro Rosa: a fertilidade durante o tratamento do câncer
Além das campanhas, o Outubro Rosa também nos convida a refletir sobre questões essenciais que impactam a vida das mulheres diagnosticadas com a doença. Entre elas, a preservação da fertilidade. Junto de especialistas, descubra tudo sobre o assunto!
Em outubro, o mundo se une para conscientizar sobre a prevenção e o combate ao câncer de mama - tipo que mais acomete mulheres no Brasil. Além das campanhas, o Outubro Rosa também nos convida a refletir sobre questões essenciais que impactam a vida das mulheres diagnosticadas com a doença. Entre elas, a preservação da fertilidade.
Segundo o Dr. Fernando Prado, especialista em Reprodução Humana, Membro da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM) e diretor clínico da Neo Vita, a quimio e radioterapia são extremamente nocivas para as células reprodutivas que irão gerar os gametas, os óvulos (no caso da mulher).
Até mesmo as meninas, adolescentes e adultas jovens podem sofrer com a infertilidade como uma sequela dos tratamentos oncológicos. “Elas terão seus ovários afetados e poderão entrar na menopausa precocemente, sendo impossível que consigam engravidar com o próprio material genético no futuro. Para esses casos, a indicação é de preservar a fertilidade com tratamentos muito importantes que possibilitam aos sobreviventes dessa doença a chance de ter filhos no futuro”, diz o médico.
A questão da preservação da fertilidade não é trivial em meio a um tratamento oncológico, justamente porque, após a cura da doença, a fertilidade pode se tornar uma questão importante para a mulher, segundo o Dr. Rodrigo Rosa, especialista em reprodução humana e diretor clínico da Clínica Mater Prime, em São Paulo. “O problema é que é muito difícil prever quais as chances de a mulher sofrer com infertilidade após a cura da doença, pois o impacto do tratamento oncológico sobre os ovários vai depender de uma série de fatores, como a gravidade do câncer, o tipo de quimio ou radioterapia utilizada e a idade da paciente”, diz o médico. “O congelamento de óvulos não é um procedimento barato. Os valores podem variar de clínica para clínica, mas é preciso colocar no planejamento os custos de todo o processo, incluindo as medicações, o procedimento em si, o armazenamento dos óvulos e, claro, a fertilização in vitro para quando a mulher estiver finalmente pronta para engravidar”, diz o Dr. Rodrigo. No ano passado, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou que as operadoras de plano de saúde precisam custear o congelamento de óvulos de pacientes com câncer de mama como medida preventiva contra a infertilidade.
Para as pacientes mais jovens, existem opções. “Se ela ainda não entrou na adolescência e não produz óvulos maduros ainda, podem ser retiradas “fatias” dos ovários. Essas amostras de tecido ovariano são congeladas e nelas estão os óvulos imaturos, que poderão ser utilizados no futuro. Outra possibilidade é estimular a ovulação e coletar os óvulos já maduros dessas mulheres. É um processo semelhante ao que é realizado quando fazemos a fertilização in vitro. Dura perto de duas semanas para termos os óvulos prontos para o congelamento”, diz o Dr. Fernando.
Também há a opção, para mulheres com parceiros, de congelamento do embrião. No entanto, para que os óvulos ou embriões sejam coletados para serem congelados, é necessário um período de estimulação farmacológica dos ovários, o que pode causar certa preocupação em mulheres com câncer devido à necessidade de adiamento do início do tratamento oncológico. Mas, ao contrário do que muitas mulheres imaginam, o tempo necessário para a estimulação ovariana é curto, durando, em média, apenas 10 a 15 dias. “No geral, o ciclo de congelamento de óvulos inicia-se com o uso de pílulas anticoncepcionais por uma ou duas semanas para desativar temporariamente os hormônios naturais. Mas, em casos de urgência, como antes da terapia contra o câncer, ignoramos essa etapa e seguimos para o processo de estimulação hormonal dos ovários e amadurecimento dos óvulos, o que leva cerca de dez dias. Após amadurecerem adequadamente, os óvulos são removidos com uma agulha colocada na vagina sob orientação de ultrassom, o que é feito com sedação intravenosa, e são congelados imediatamente”, diz o Dr. Rodrigo Rosa. “Ou seja, quando a mulher é rapidamente encaminhada a um centro de reprodução humana, a criopreservação dos óvulos não retarda significativamente o início do tratamento do câncer, sendo assim uma opção válida e segura que não possui grande impacto sobre as chances de cura da doença”, afirma o especialista em reprodução humana.
O Dr. Fernando Prado explica que essa preservação pode durar por décadas e, se no futuro a pessoa não puder engravidar ou ter filhos naturalmente, terá a oportunidade de utilizar o material criopreservado. “Óvulos e espermatozoides são utilizados para fertilização in vitro e formação de embriões, que posteriormente são transferidos para o útero, possibilitando a gravidez. Já o tecido ovariano pode ser reimplantado sobre os próprios ovários de onde foi extraído, ou mesmo implantado em outros tecidos, como na gordura da pele do braço”, destaca o Dr. Fernando Prado. Segundo o Dr. Fernando, esse tecido ovariano passa a ser estimulado pelos hormônios do organismo da mulher e passa a produzir óvulos maduros, que darão origem a uma gravidez.
O congelamento de óvulos possui grandes taxas de sucesso. “Taxas de descongelamento de óvulos e de fertilização bem-sucedida de 75% são esperadas em mulheres de até 38 anos de idade. Dessa forma, para 10 óvulos congelados, espera-se que sete sobrevivam ao degelo e cinco ou seis fertilizem e se tornem embriões. Normalmente, de três a quatro embriões são transferidos em mulheres de até 38 anos de idade. Portanto, recomendamos que 10 óvulos sejam armazenados para cada tentativa de gravidez. A maioria das mulheres com 38 anos de idade ou menos pode esperar colher de 10 a 20 óvulos por ciclo”, destaca o Dr. Rodrigo. Além disso, a criopreservação é um procedimento muito seguro, tanto para a mãe, quanto para o bebê. “O maior estudo publicado sobre o assunto, com mais de 900 bebês de óvulos congelados, não mostrou aumento na taxa de defeitos congênitos quando comparado à população em geral. Além disso, os resultados de um estudo não mostraram taxas aumentadas de defeitos cromossômicos entre embriões derivados de óvulos congelados em comparação com embriões derivados de óvulos frescos. Em 2014, um novo estudo mostrou que as complicações na gravidez não aumentaram após o congelamento dos óvulos. Também houve mais de 300.000 crianças nascidas em todo o mundo de embriões congelados usando principalmente técnicas de criopreservação de congelamento lento, sem um aumento de defeitos congênitos”, enfatiza o Dr. Rodrigo Rosa.
Por fim, o Dr. Fernando explica que compete aos médicos fornecer essas informações às pacientes que estão em risco de perder sua fertilidade em virtude do tratamento para o câncer. “Embora seja um momento muito difícil, com outras questões prioritárias, preservar a fertilidade é algo que precisa ser pensado e discutido”, finaliza o Dr. Fernando.